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sexta-feira, 22 de maio de 2009

Livre...

Dentre as coisas que vi e ouvi
Fico com aquelas que
Fascinam minha mente
Em cascatas de sonhos
Desvairados
Suave folha que cai sem
Encontrar-se com a responsabilidade do tempo...

domingo, 17 de maio de 2009

Civilização Grega - Primeiro ano PADRÃO e Curso APROVAÇÃO

A Civilização Grega

1) As origens

1a) Os tempos pré-homéricos: predomínio dos cretenses
O berço da civilização ocidental é, tradicionalmente, apontado como a Grécia antiga. Na realidade, podemos ver que, anteriormente aos gregos, desenvolveu-se a civilização cretense, ou egeana.













A civilização cretense teve início por volta do terceiro milênio. a.C., atingindo sua expressão maior entre 2000 a 1500 a.C. Seu foco principal era a ilha de Creta, no mar Egeu. Era um povo essencialmente comerciante, que manteve ativo intercâmbio com o Egito, Ásia Menor e ilhas do mar Egeu. Exportava objetos de cerâmica, tecidos e vinho, importando metais, mármore, marfim, vidros.
Sua sociedade era bastante original e desenvolvida, dando lugar de destaque à mulher. Há fortes evidências de que não admitia a escravidão. A sociedade apresentava uma classe de ricos proprietários de terras, que detinham o poder político. A classe dos comerciantes era expressiva, mas não chegou a participar do poder.
Reflexo da pujança econômica, desenvolveu-se uma arte esplêndida, com destaque para as pinturas naturais e os vasos de cerâmica. Escavações feitas no Palácio de Cnossos revelaram que os cretenses possuíam tecnologia desenvolvida, pois se encontraram ruínas de banheiros e de um sistema de esgotos.
Esta brilhante civilização sofreu forte abalo, quando a região foi invadida pela tribo dos aqueus, por volta de 1500 a.C. Os aqueus eram uma das tribos das quais se originou, posteriormente, o povo grego. Apesar da destruição de Creta, a legados da civilização egeana ainda perduraram em Micenas e Tróia. No século XII a.C. os invasores dórios atingiram a Grécia e a Ásia menor. Nesse contexto, Tróia foi destruída pelos gregos no século XI a.C. e a civilização cretense desapareceu completamente.

2) Períodos históricos

2a) Tempos homéricos
Os aqueus e os dórios, tribos que destruíram as bases da civilização cretense, formam os povos que, juntamente com os jônios e os eólios, deram origem ao povo grego.
Por meio do mapa anterior, pode-se verificar a localização da Grécia antiga. Verifique que, ao lado da Grécia continental, havia uma Grécia insular e uma asiática. Na parte asiática, residiam principalmente os primitivos habitantes (Pelasgos, Eólios e Jônios) que fugiram da península balcânica quando ocorreram as invasões dos dórios – Primeira diáspora Grega.
Estas invasões ocorreram até o século XII a.C. Desse período até o século VIII a.C. pouco se sabe da história dos gregos. As fontes disponíveis para o conhecimento de tão longo período são ruínas e, principalmente, dois poemas de autoria de Homero, a Ilíada e a Odisséia. No primeiro poema, Homero trata da Guerra de Tróia e, no segundo, da volta do rei Ulisses, que havia tomado parte no conflito.
As informações que podem ser extraídas dos dois poemas, apesar de valiosas, são poucas. Pode-se, por exemplo, saber que os gregos, inicialmente, em conseqüência das invasões, dedicaram-se a uma vida predominantemente rural, baseada nas comunidades gentílicas (Genos). Ao final do período, organizaram-se em cidades-Estado (polis), característica que, como veremos a seguir, marcou a história daquele povo.

2b) Tempos arcaicos
Do século VIII a.C. ao século V a.C., temos o Período Arcaico da historia grega. Esse momento é assinalado pela expansão comercial e marítima (segunda diáspora grega), decorrente da pobreza do solo. Os marinheiros gregos percorreram o Mediterrâneo, fundando colônias em sua orla.
Entre as colônias e as cidades de onde os marinheiros saiam, estabeleciam-se importantes laços econômicos, o que teve como conseqüência tornar a atividade comercial a mais importante da economia grega.
Reflexo do crescimento da nova atividade foi o surgimento de uma poderosa classe de comerciantes que, em pouco tempo, passou a lutar por direitos, principalmente políticos, já que nas cidades-Estado eram as famílias nobres que estavam no poder. Dessas lutas resultaram importantes modificações nas formas políticas. A mais destacada delas foi a criação da democracia na cidade-estado de Atenas.

2c) Tempos clássicos
Os séculos V e IV a.C. constituem o que os autores denominam a “época de ouro” da história grega, ou Período Clássico. Com efeito, foi nesse momento que a civilização grega atingiu seu apogeu: a instituição da democracia, as obras dos principais artistas e filósofos são dessa fase.
No entanto, foi também nesse período que alguns problemas graves surgiram, contribuindo para que, em seguida ao apogeu, tivesse lugar a decadência da Grécia. Exerceram particular influência nesse aspecto as guerras contras os persas e, em seguida, a guerra que envolveu as duas maiores cidades-Estado, Atenas e Esparta.
As guerras contra os persas, denominadas Guerras Médicas, foram resultado da expansão dos persas sobre a Ásia Menor, onde existiam cidades gregas. Tais cidades não se submeteram e foram apoiadas pelas cidades do continente, dando inicio ao conflito. Curiosamente, as cidades-Estado gregas, que até aquele momento haviam existido de forma autônoma e sem maiores ligações entre si, formaram uma aliança para enfrentar os persas. Se a aliança mostrou-se eficaz, pois, de fato, os persas foram derrotados, revelou-se nefasta no segundo momento. Atenas e Esparta tornaram-se imperialistas, dominando ou exercendo influência sobre outras cidades-estado. Do choque desses dois imperialismos resultou uma nova guerra, desta vez envolvendo as próprias cidades gregas: a Guerra do Peloponeso.
Esparta liderou a Liga do Peloponeso, enquanto Atenas comandava a Confederação de Delos. Com o desenvolvimento do conflito toda a Grécia perdeu: o enfraquecimento das cidades-Estado era visível, e elas foram presas fáceis para um conquistador estrangeiro - Felipe da Macedônia. Em 338 a.C., Felipe derrotou as tropas gregas na batalha de Queronéia, dominando toda a península. Após sua morte, a dominação foi mantida por seu filho Alexandre Magno.

2d) Tempos helenísticos

(Império Helenístico: máxima extensão sob Alexandre Magno)
Alexandre, após consolidar o domínio da Grécia, avançou com seus exércitos, em direção ao Oriente, chegando até próximo à Índia. A esse momento os autores denominam Período Helenístico, definindo este termo como resultado da fusão da cultura grega com a oriental. Após a morte de Alexandre Magno, o império se fragmentou, dividindo entre seus generais. Antígono recebeu a Macedônia e a Grécia; Ptolomeu ficou com o Egito; e Seleuco herdou a Mesopotâmia, Síria e a Pérsia. No século I a.C., todas essas regiões foram dominadas pelos romanos.

3) Uma visão panorâmica da civilização grega
3a) Economia
Nos seus primórdios, a economia das inúmeras comunidades gregas era fundamentalmente agrária, sendo, por conseguinte, a posse da terra o elemento determinante para a definição da condição sócio-econômica dos indivíduos, bem como o seu grau de participação política na sociedade. Assim, na maioria das cidades-Estado helênicas, ocorreu uma progressiva concentração do poder nas mãos da aristocracia, segmento social formado pelos grandes proprietários rurais. A conseqüência política desse processo foi a evolução das monarquias para oligarquias (“governo de poucos”). “À medida que os detentores de grandes propriedades ganhavam poder econômico cada vez maior, resolveram arrebatar a autoridade política do governante, já então comumente chamado de Rei, e dá-la a um conselho, que eles geralmente manobravam. Por fim, aboliram completamente a monarquia”. (BURNS, EDWARD McNALL. OP. CIT. P. 95).
O território grego não oferecia condições muito adequadas para a prática da agricultura, devido ao seu reduzido tamanho, além de ser excessivamente montanhoso e não existirem grandes rios. Destarte, desde muito cedo, os gregos foram obrigados a se dedicarem à atividade comercial, como já se referiu anteriormente.
A partir do século VIII a.C., teve início a ocupação de novos territórios, onde eram fundadas colônias. Tais movimentos colonizatórios, alcunhados de segunda diáspora grega levaram os gregos a ocupar áreas da Ásia Menor (o litoral da Anatólia); o Mar de Mármora e o Mar Negro, regiões cortadas por inúmeros estreitos e onde foi fundada a cidade de Bizâncio; e anexar o sul da Itália, a Magna Grécia, polvilhada de cidades, destacando-se: Tarento, Síbaris, Crotona e Nápoles. Na Sicília, edificou-se outro importante centro urbano: Siracusa. “A colônia (chamada APOIKIA - lar distante - pelos gregos) era independente da metrópole, isto é, da Polis que a havia fundado. Os laços eram religiosos e comerciais: para a sua fundação consultava-se o oráculo de Delfos; na colônia também ardia o fogo sagrado trazido da polis originaria; possuíam deuses e um calendário comum. Quando começavam a se estabelecer relações comerciais mais ativas entre elas surgiam as rivalidades comerciais, levando por vezes a guerra entre a colônia e a sua metrópole. Na realidade não se formara ainda um império grego embora se multiplicassem as cidades-Estado gregas por quase todo o Mediterrâneo. Dessa maneira as colônias tinham suas próprias instituições políticas, suas próprias formas de Estado, não havendo laços políticos de dependência entre elas e as cidades fundadoras. As relações comerciais constituíam o principal elo entre colônia e metrópole”. (AQUINO, Rubim Santos Leão de. OP. CIT. P. 182).
A colonização grega no Mediterrâneo implicou a helenização cultural da região, e uma ampla circulação de bens agrícolas entre as colônias e as cidades-Estado da Grécia. Localizadas em solos férteis, as colônias passaram a produzir gêneros em abundância, cujos excedentes eram exportados para o território grego original. Essa crescente importação de produtos agrícolas coloniais provocou o declínio da estrutura agrária tradicional. De início, foram arruinados os pequenos proprietários; em seguida, a própria aristocracia foi solapada em seu poderio econômico. Agora, as terras em mãos da aristocracia dedicavam-se ao plantio de vinha e oliva. Assim o circuito comercial entre as colônias e a Grécia passou a ser o seguinte: as primeiras forneciam alimentos e os gregos exportavam vinho e azeite para as regiões coloniais. Como a plantação da vinha e da oliva exigiam grandes contingentes de mão-de-obra, progressivamente difundiu-se o sistema escravista.
Na Grécia, três eram as formas de aquisição de escravos: conquista, compra ou escravização por dívidas. Noutros termos, todo e qualquer devedor que não tivesse condições de pagar seus débitos era, junto com sua família, escravizado pelo credor. As maiores vítimas dessa legislação eram os pequenos proprietários de terra, que, não dispondo de recursos para o plantio, tomavam empréstimos de agiotas e da aristocracia, acabando por perder, de início, as propriedades e, logo em seguida, a liberdade. A decadência da agricultura tradicional grega acarretou a urbanização, o incremento do artesanato e um extraordinário progresso comercial. Em conseqüência, a maior parte das populações das cidades-Estado passaram a se dedicar a atividades especificamente urbanas; comércio, artesanato e profissões liberais. Nas cidades, enriqueceu-se a camada de comerciantes e artesãos, favorecida com o advento de uma economia monetária (troca de mercadoria por moeda - Século VII a.C.), superando a economia natural (baseada na troca de produtos). Foi nesse contexto que o sistema escravista começou a se enraizar na sociedade grega, gerando a ampliação das contradições sócio-políticas. “(...) as condições de trabalho escravo fizeram piorar o nível de vida da população pobre, sobretudo dos escravizados por dívidas. (...) Como o artesanato empregava um grande numero de trabalhadores escravos (...), a concorrência entre artesãos livres e escravos degradou o artesanato, desvalorizando os salários dos artesãos livres. Os proprietários de oficinas preferiram investir mais na agricultura de exportação e na compra de escravos do que na expansão do artesanato. (...) O mercado interno praticamente inexistia e o artesanato passava a produzir para um mercado distante. O Excedente populacional não encontrava, desse modo, escoamento no artesanato, o que agravava os antagonismos sociais e acirrava as lutas políticas”.(AQUINO, Rubim Santos Leão de. OP. CIT. P. 184).
O novo cenário grego gerou uma profunda contradição: o poderio econômico concentrava-se, de maneira crescente, nas mãos dos setores sociais urbanos, mas, pelo menos no início desse processo, o poder político continuava monopolizado pelas oligarquias agrárias. Assim, “(...) Estes séculos foram marcados por intensas lutas sociais, entre a aristocracia territorial e os grupos populares. Note-se que esses `grupos populares`abrangiam os ricos comerciantes que, muitas vezes, traiam a massa da população, abandonando o povo e aliando-se aos grandes proprietários. As contradições sociais principais, porém, verificaram-se entre os homens livres e os escravos, cujo numero crescia devido à importação, à escravidão por dividas e as guerras contra os bárbaros (não-gregos)”. (AQUINO, Rubim Santos Leão de. OP. CIT. P. 185.).
Essa crescente tensão social levou, progressivamente, a transformações políticas que, particularmente em Atenas, determinaram a evolução de uma estrutura oligárquica (governo nas mãos de alguns poucos) para uma democracia (governo dos cidadãos).
CONSEQUÊNCIAS DA SEGUNDA DIÁSPORA GREGA (EXPANSÃO COMERCIAL E MARÍTIMA GREGA)
Decadência e Reorganização agrícola da Grécia
Desenvolvimento de uma sociedade urbano-mercantil
Enfraquecimento econômico e político das oligarquias agrárias com o conseqüente fortalecimento dos setores sociais urbanos
Dentre as mais de 160 cidades-Estado gregas, destacaram-se duas Polis: Esparta e Atenas.

3b) Sociedade
A sociedade grega apresentava configurações diferenciadas, em grande parte devido à estruturação política das cidades-Estado. É claro que existiam semelhanças (família patriarcal, conceito de cidadania, por exemplo), mas as diferenças eram notáveis. Generalizando-se, pode-se afirmar que as cidades da Grécia rural e aquelas cujo processo de criação foi violento, com a imposição de um grupo sobre os demais, permaneceram, durante todo o período, com uma sociedade fechada, sem mobilidade possível. Já as cidades da Grécia marítima e aquelas cuja criação se deu pacificamente experimentaram grandes mudanças. Vejamos os dois exemplos mais característicos.

3b1) A sociedade espartana
A sociedade espartana estava dividida em três grupos básicos: os espartanos ou esparciatas, os periecos e os hilotas. Os esparciatas eram os descendentes dos primitivos dórios. Constituíam a aristocracia, que dominava amplamente a estrutura econômica, e detinham o poder político. Sua educação era toda voltada para a formação de bons soldados.
Os periecos eram trabalhadores livres, mas não possuíam direitos políticos. Não lhes era vedado exercer qualquer atividade econômica, desde que pagassem os tributos devidos. Descendiam das tribos que habitavam o Peloponeso, quando da invasão dória, e que não ofereceram resistência à conquista. Quando necessário, eram obrigados a prestar serviço militar.
Os hilotas eram escravos do Estado. Trabalhavam, geralmente, na terra e não dispunham de qualquer direito. Eram mantidos sob um regime de terror. Descendentes dos primitivos habitantes, que ofereceram resistência à dominação dos dórios, foram transformados em escravos. O temor que inspiravam aos esparciatas era tal (principalmente devido ao seu grande numero) que, periodicamente, se decretavam contra eles a kriptia: em determinado dia do ano, os jovens esparciatas que estavam se adestrando nas artes militares eram autorizados a matar quantos hilotas encontrassem. Tal política, que pode ser definida como terrorismo de Estado, possuía, todavia, raízes históricas profundas nas origens de Esparta: Após conquistarem a cidade de Micenas, os dórios fundaram Esparta, localizada no centro da planície da Lacônia. Em seguida à ocupação da Lacônia, os dórios – etnia que originou os espartanos – anexaram os territórios vizinhos, notadamente a planície da Messênia: “Os primeiros espartanos foram dórios, que haviam chegado ao peloponeso oriental como um exercito invasor. De inicio tentaram fundir-se aos micenianos que ali encontraram. Entretanto, surgiram conflitos, e os espartanos recorreram à conquista. Ainda que no fim do século IX a.C tivessem dominado toda a região da Lacônia, não estavam satisfeitos. A oeste das montanhas do Taígeto estendia-se a fértil planície da Messênia. Os espartanos decidiram-se pela sua conquista. A aventura teve êxito e o território messênio foi anexado à lacônia. Por volta de 640 a.C. os messênios obtiveram o auxilio de Argos e desencadearam uma revolta. A guerra que se seguiu foi encarniçada; (...) Dessa vez os vencedores não se arriscaram. Confiscaram as terras dos messênios, assassinaram ou expulsaram os seus chefes e reduziram as massas à condição de escravos públicos, os hilotas. Após as guerras messênias, os espartanos recearam que novas guerras externas dessem oportunidades para um levante dos hilotas; por conseguinte, Esparta dedicou-se a manter o que já havia obtido e a perpetuar a dominação sobre os hilotas”. (BURNS, EDWARD McNALL. OP. CIT. P. 97).
Todas as características desenvolvidas no cotidiano de Esparta possuem, direta ou indiretamente, relações com as guerras travadas contra os messênios. Os espartanos possuíam um temor mortal de serem dominados por uma insurreição dos hilotas. Esse medo, de certa forma, explica o seu conservadorismo, sua obstinada resistência a mudança, para que nenhuma inovação resultasse num fatal enfraquecimento do sistema. O provincialismo espartano pode ser também atribuído a mesma causa. Amedrontados pela perspectiva de que idéias perigosas pudessem ser introduzidas na cidade, condenavam as viagens e proibiam o comercio com o exterior, exceto com cidades muito aliadas. A necessidade de manter uma supremacia absoluta de um número pequeno de cidadãos sobre uma enorme massa de escravos públicos exigia disciplina férrea e completa subordinação do individuo. Por fim, o grande atraso cultural de Esparta nasceu da atmosfera de repressão, resultado inevitável da violenta luta para conquistar os messênios e mantê-los sob severa sujeição.
Embora cada família de esparciatas recebesse um lote de terras - o kleros - cultivado por hilotas, era o Estado que administrava a economia. Por essa razão convencionou-se chamar o regime econômico espartano de hilotismo, para acentuar as diferenças entre o escravismo praticado na quase totalidade do mundo grego e a escravidão pública que caracterizou o regime espartano. Tanto as terras quanto os hilotas pertenciam ao Estado: o esparciata não podia vender, nem ceder, nem legar por herança o kleros, a não ser ao filho mais velho na condição de posse, assim como não podia vender os hilotas. As atividades principais eram a agricultura e a pecuária, complementadas pelo comercio e artesanato praticados pelos periecos.

3b2) A sociedade ateniense
A sociedade ateniense apresentava inúmeros contrastes com a de Esparta. Lá, em seu auge, também havia três grupos sociais: os cidadãos, os metecos e os escravos.
Os cidadãos eram todos aqueles que dispunham de direitos políticos: nobres, comerciantes, proprietários de terras. Do ponto de vista numérico, era o menor grupo.
Os metecos eram os estrangeiros que passavam a residir em Atenas. Além de não possuírem direitos políticos, também não podiam casar-se com atenienses. Não havia proibições quanto a atividades econômicas que viessem a desempenhar, embora não pudessem ser proprietários de terras.
Os escravos eram numerosos e aumentaram ainda mais, quando a colonização teve início. Eram empregados em serviços domésticos, como marinheiros, agricultores e trabalhadores em geral. Havia também os escravos do Estado, que eram utilizados na limpeza publica e no policiamento.

3b3) Sociedades diferentes; sistemas educacionais diferentes.
Um aspecto que chama atenção diz respeito à educação das crianças e jovens nas duas cidades. Em Esparta, a educação era essencialmente voltada para a criação de bons soldados. Os meninos eram educados pelo Estado, recebendo basicamente instrução física, a partir dos sete anos de idade. Aliás, desde o nascimento, o Estado se preocupava com as crianças. Quando nasciam com algum defeito físico, eram jogadas a um abismo ou abandonadas para morrer. Plutarco, um grande historiador da antiguidade, assim descreve a educação espartana:
“Ensinavam a ler e escrever apenas o estritamente necessário. O resto da educação visava acostumá-los à obediência, torná-los duros à adversidade e fazê-los vencer no combate. Do mesmo modo, quando cresciam, eles recebiam um treinamento mais severo: raspavam a cabeça, andavam descalços e brincavam nus a maior parte do tempo. Tais eram seus hábitos. Quando completavam doze anos, não usavam mais camisa. Só recebiam um agasalho por ano. Negligenciavam o asseio, não conheciam mais banhos nem fricções, a não ser em raros dias do ano, quando tinham direitos a essas boas maneiras. Dormiam juntos, agrupados em patrulhas e tropas, sobre catres que eles próprios fabricavam (...)”. (PLUTARCO. A vida de Licurgo apud PINSKY, Jaime. 100 testos de história antiga. 4 ed. São Paulo: Contexto, 1988, p.109.).
Já em Atenas, a educação, também iniciada aos sete anos, compreendia leitura, escrita, ginástica, musica e pintura. Não existia aquela preocupação exclusiva com a formação de um bom soldado, mas de um cidadão completo.

3c) Estruturas políticas

3c1) Características gerais das pólis
Como já salientamos por diversas vezes, a vida política da Grécia antiga era assinalada pela existência da polis, ou cidade-Estado. A polis possuía total autonomia. O ideal buscado pelos gregos era o da auto-suficiência. No plano cultural, evidentemente, encontramos certa semelhança no que diz respeito à língua e religião.
A cidade-Estado não foi uma invenção dos gregos. Muito antes, a sociedade mesopotâmica dos sumérios e os fenícios já se haviam organizado politicamente em cidades-Estado. Na Grécia, essa forma de organização política teve origem no final da época homérica e no inicio da chamada época arcaica. Sua origem está ligada à progressiva desintegração dos genos, fenômeno marcado pelo estabelecimento da propriedade privada e de desigualdades sociais, quando uma aristocracia de nascimento distanciou-se do restante da comunidade, apoderou-se dos meios produtores de riquezas e, consequentemente, do poder político.
Além do exposto, o processo de formação das Polis gregas foi acompanhado de algumas outras características gerais, a saber:
· As comunidades (ligadas pelo parentesco direto ou indireto) se uniram obedecendo ao principio da territorialidade ou da vizinhança. As comunidades de vizinhança se uniram dando origem a Polis, com governo próprio, em um processo conhecido como sinecismo (agrupamento).
· O fato principal que acelerou a formação e o crescimento das Polis gregas foi o desenvolvimento das trocas e do artesanato. Esse processo foi dinamizado pela expansão territorial (segunda diáspora) que aumentou em variedade e quantidade o fluxo das mercadorias. Em linhas gerais: Na medida em que se expandiram às atividades comercial e artesanal, cresceram as polis. Contudo, exceção seja feita ao caso de Esparta. Originada de etnia militarista, Esparta cresceu por meio da expansão territorial (conquista da Messenia), introvertendo-se no aspecto econômico.
· Na Grécia arcaica, o aparecimento da cidade-Estado tornou irreversível a desagregação das comunidades gentílicas. O progressivo crescimento das atividades comercial e artesanal foi acompanhado pelo aumento do uso do braço escravo nas atividades urbanas e na agricultura. A Polis tornou-se o centro da exploração dos escravos e dos camponeses pobres, pois abrangia o núcleo urbano e as áreas adjacentes. A sociedade grega transformou-se em sociedade escravista, composta de duas classes antagônicas: de um lado, a aristocracia proprietária de terras e escravos; de outro, os escravos, que não possuíam direitos. Entre essas duas classes sociais básicas, situavam-se: no campo, pequenos proprietários, geralmente endividados com a aristocracia fundiária; na cidade, os artesãos livres, ameaçados com o predomínio dos escravos nas oficinas, os comerciantes e os armadores, fortalecendo-se com o comércio marítimo. Assim, o declínio das comunidades gentílicas gerou os antagonismos sociais internos.
· Mas as Polis gregas não foram marcadas somente por antagonismos internos. Cada uma delas, consciente de sua soberania, tendia a expandir-se à custa de regiões vizinhas gerando rivalidades externas (entre as Polis). O estado de permanente rivalidade entre as cidades gregas beneficiava os comerciantes de escravos (os militarmente derrotados eram escravizados) e possuía relação com os conflitos sociais internos das cidades porque a crescente escravização impedia o uso produtivo da população excedente.
· Ao longo da antiga História da Grécia, floresceram mais de 160 cidades-Estado. Quase todas elas eram localizadas em colinas, cujo símbolo da autonomia era a Acrópole, templo construído no topo das elevações topográficas onde também se localizavam a residência do Basileu (Rei) e o local de reunião do conselho de aristocratas.
Representação da Acrópole de Atenas
Com o desenvolvimento das trocas comerciais e do artesanato, surgiu a parte baixa da cidade: a Ágora (praça do mercado usada para transações comerciais e reuniões publicas) e, nas cidades litorâneas, o porto (por exemplo, o Pireu, em Atenas), por onde se fazia importação e exportação de mercadorias. Além desses elementos típicos as cidades gregas possuíam teatro, ginásio de esportes e uma fonte que abastecia um reservatório de água.
· As cidades gregas eram, em geral, pequenas, contribuindo para isto alguns elementos: os meios de subsistência eram relativamente escassos para atender a demanda do crescimento demográfico e a concentração fundiária limitava ainda mais a viabilização da sobrevivência para grandes concentrações humanas tanto que, no século VIII a.C., os gregos enfrentaram a “alternativa de morrer de fome ou exportar o excedente da população para além-mar, com o objetivo de tomar posse, pela força militar, de novas terras cultiváveis”. (TOYNBEE, A. J., Helenismo: História de uma civilização. Zahar Editores, Rio de Janeiro, 1969, p.48). Contudo, vale ressaltar, Esparta e Atenas se constituíram como exceções ao padrão dimensional das cidades gregas. Segundo BURNS, “(...) Esparta e Atenas tinham, invariavelmente, a maior extensão e população. No auge de seu poder. Atenas e Esparta, cada qual com uma população de cerca de 400.000 habitantes, contavam com uma força numérica aproximadamente três vezes maior que a da maioria dos Estados vizinhos”. (BURNS, EDWARD McNALL. OP. CIT. P.95).

3c2) Estrutura política de Esparta
Em Esparta, como já se viu, apenas um grupo social participava do poder político. Isso se justificava pela necessidade dos descendentes dos dórios manterem a dominação sobre os demais grupos sociais. Apenas os esparciatas participavam dos órgãos de governo, como pode ser visto no organograma.
(Fonte: FARIA, R. et alli. História. Belo Horizonte: Editora Lê, 1998, p. 32).
Havia dois reis (diarquia), cada um com uma função específica: um para as funções religiosas e outro para as militares. Os dois reis participavam do senado (Gerusia) com mais 28 senadores. A condição básica para integrar o senado era a idade superior a sessenta anos, além, é claro, de pertencer ao grupo dominante. Cabia a Gerúsia a elaboração e aprovação (através do exercício do direito de VETO) das leis espartanas – um poder legistativo, composto por uma minoria que concentrava as decisões principais (Oligarquia – Governo da minoria). O Eforato era um dos órgãos mais importantes. Composto por cinco éforos, eleitos pela Assembléia Popular, para um mandato anual, tinha como funções principais a fiscalização da diarquia, o julgamento de processos e as finanças. A assembléia Popular (Apela) era formada por todos os cidadãos (esparciatas) maiores de trinta anos. Na realidade, a sua função era meramente decorativa, pois apenas referendava os projetos do Senado (Gerusia). Esta estrutura política manteve-se ao longo de toda a historia espartana. O conservadorismo era, portanto, o aspecto mais característico daquela cidade-Estado.
AS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS ESPARTANAS
A DIARQUIA - Constituída por dois reis que representavam as duas mais importantes famílias de Esparta – os Agíadas e os Europontidas - e que exerciam funções religiosas e militares.
A GERÚSIA - Conselho composto por 28 anciãos (os “gerontes”) com mais de 60 anos de idade. A esse Conselho competia a elaboração das leis: fundamento do poder político e do ordenamento jurídico de Esparta.
A ÁPELA - Assembléia formada por cidadãos com mais de trinta anos. Tinha como funções eleger os membros da Gerúsia e ratificar suas decisões, além de escolher o conselho dos Éforos (eforato).
O EFORATO OU CONSELHO DOS CINCO ÉFOROS (“VIGILANTES”) - Órgão executivo do governo espartano era formado por cinco cidadãos eleitos anualmente pela Ápela e cuja incumbência era a fiscalização da obediência as leis e da vida econômica dos cidadãos.

3c3) A estrutura política de Atenas
Em Atenas, como nas demais cidades-Estado em que o processo de fundação foi pacífico e que, ao longo do período, participaram ativamente da atividade comercial e colonizadora, ao contrario da Esparta, as instituições políticas alteraram-se profundamente.
Como em praticamente todas as cidades-estado gregas, Atenas conheceu, inicialmente, a forma monárquica de governo. O rei, chamado Basileus, acumulava as funções militares sacerdotais e judiciais. Seu poder era limitado pelo Areópago, conselho de aristocratas.
A aristocracia, formada basicamente por proprietários de terras, terminou por assumir as funções governamentais, instituindo uma verdadeira oligarquia. Esse período ficou conhecido como do Arcontado. Os Arcontes, progressivamente, assumiram os poderes reais. Segundo AQUINO, “No século VIII a.C., a realeza também já se encontrava em dissolução: a obediência ao rei era apenas nominal, por parte dos chefes das famílias nobres ou clãs, reunidos no Areópago. Em meados do século, a realeza cedeu lugar ao regime aristocrático: o Arcontado, composto por nove Arcontes, substituiu o rei nas funções executivas. Os Arcontes, eleitos pela aristocracia territorial que se tornava escravista, tiveram mandato, a principio, com duração de dez anos; depois, de apenas um ano. O principal era o Arconte Epônimo, com funções administrativas; O Arconte Basileus, ficou com as funções religiosas; as funções militares (e jurídicas sobre estrangeiros) couberam ao Arconte Polemarca e os Arcontes Thesmothetas aplicavam a justiça sobre os atenienses que gozavam ou não dos benefícios da cidadania. Através do Areópago, a aristocracia territorial estabelecia as diretrizes de atuação dos magistrados”. (AQUINO, Rubim Santos Leão de. OP. CIT. P.190).
OS ARCONTES: O PODER EXECUTIVO DA ATENAS OLIGÁRQUICA.
ARCONTE POLEMARCA – Responsável pelo poder militar e julgamento dos estrangeiros.
ARCONTE EPÔNIMO – Chefe da administração.
ARCONTE BASILEUS – Chefe da religião.
ARCONTES THESMOTHETAS – juízes encarregados de manter as leis entre os atenienses detentores ou não de cidadania.
Essa foi uma época de sofrimento para a população, em grande parte devido à ausência de leis escritas, o que colocava as pessoas mais humildes totalmente à mercê da vontade dos aristocratas.
Quando a colonização teve início, como já se falou, um grupo numeroso de comerciantes surgiu. Enriquecendo-se rapidamente com a nova atividade, esse grupo passou a questionar o poder dos aristocratas, dando origem a uma serie de lutas sociais. A introdução de reformas produzidas por alguns legisladores fez com que as estruturas políticas caminhassem para a criação da democracia. As primeiras leis nesse sentido foram as de Drácon. Apesar de beneficiarem basicamente a aristocracia, foram significativas, na medida em que eram as primeiras leis escritas da cidade. A reforma draconiana, de cunho repressivo, e o enriquecimento cada vez maior das camadas ligadas ao comércio marítimo aumentaram a tensão social. Em 594 a.C., um aristocrata lúcido, Sólon, ciente de que seria melhor “ceder os anéis para não perder os dedos”, elaborou uma nova legislação. Os principais aspectos das reformas de Sólon foram:
AS REFORMAS DE SÓLON
Amenização da severidade das leis draconianas.
Extinção da escravidão por dívidas.
Devolução das terras aos antigos proprietários que as tinham perdido para seus credores.
Fixação de limites para a extensão das propriedades agrárias.
Admissão dos Thetas (trabalhadores livres não-proprietários de terras) na Eclésia (assembléia popular).
Criação do Helieu (tribunal de justiça que permitia a participação de todos os cidadãos).
As magistraturas passariam a ser exercidas por todos os cidadãos de Atenas.
O fundamento judiciário da legislação de Sólon foi o conceito de Isonomia: a igualdade de todos perante a lei. Do ponto de vista sócio-político, a reforma de Sólon criou uma República Censitária, cuja hierarquia era definida pelos rendimentos.
AS CLASSES SOCIAIS DA REPÚBLICA CENSITÁRIA
PENTACOSIMEDINAS - Setor social que atingia a renda de 500 Dracmas (moeda grega) anuais.
CAVALEIROS - Os que auferiam renda entre 300 e 500 Dracmas por ano.
ZEUGITAS - Os que tivessem rendimentos entre 200 e 300 Dracmas ao ano.
THETAS - Os detentores de renda inferior a 200 Dracmas anuais.
Agora, todos os segmentos sociais poderiam participar da Eclésia (Assembléia Popular) e do Helieu (Tribunal Popular), mas somente as três classes superiores participavam da Bulé (Conselho dos 400), responsável pela elaboração das leis a serem votadas da Eclésia. Na prática, contudo, só os indivíduos mais ricos poderiam exercer as funções dos magistrados – Arcontes -, pois estas exigiam dedicação exclusiva sem qualquer remuneração.
As INSTITUIÇÕES DE ATENAS (REFORMAS DE SÓLON).
ARCONTADO – Composto somente pelos eupátridas e comerciantes mais ricos, exercia o poder executivo.
AREÓPAGO – Com a mesma composição social do Arcontado, tinha a função de fiscalizar o poder executivo.
BULÉ (CONSELHO DOS 400) – Formado por eupátridas, cavaleiros e zeugitas, exercia o poder legislativo de Atenas. Poderia vetar decisões da Eclésia.
HELIEU – Tribunal de justiça que poderia ser integrado por todos os segmentos.
ECLÉSIA – Assembléia popular. Exercia o poder de voto para as magistraturas e projetos de lei que eram elaborados pelo Bulé (Embora ao thetas pudessem participar desse órgão, não tinham como interferir na organização dos trabalhos, não podiam propor leis e pouco participavam porque necessitavam trabalhar em tempo integral para sobreviver).
Inegavelmente, as reformas de Sólon ampliaram a faixa de participação política dos cidadãos ligados às atividades mercantis e atenderam, parcialmente, aos reclamos dos setores populares. Essas mudanças, entretanto, desagradaram a aristocracia e não foram aceitas pelas camadas populares menos privilegiadas que desejavam reformas mais radicais. O grande fator da tensão social permanecia: a questão da estrutura da propriedade fundiária e a divisão do poder político. “Embora beneficiasse as camadas intermediárias de comerciantes, de armadores e de proprietários de oficinas artesanais, a cujos interesses estava ligado Sólon, a nova constituição política de Atenas ainda consagrava a importância política das antigas tribos, base do poder da aristocracia de nascimento. Além disso, foram mantidas as grandes propriedades dos eupátridas, embora a massa da população reclamasse a redistribuição das terras. Conseguindo desagradar aos eupátridas, que tiveram de fazer grandes concessões, e descontentando a maioria dos cidadãos, por lhes ter dado pouco, as reformas de Sólon acirraram as lutas de classes em Atenas, favorecendo o advento da tirania.”. (AQUINO, Rubim Santos Leão de. OP. CIT. 193).
Apesar do descontentamento proveniente dessas camadas sociais, não há como negar que, após as reformas de Sólon, Atenas conheceu um período de relativa paz social, fato esse que permitiu o desenvolvimento de uma política imperialista, cuja primeira manifestação concreta foi a guerra contra Mégara, disputando a baía de Salamina. Nessas batalhas, Pisístrato, grande general, foi importante. Simultaneamente aos conflitos expansionistas, Atenas conheceu a formação de três grandes partidos:

OS PARTIDO POLÍTICO NO FIM DO PERÍODO OLIGÁRQUICO
PARTIDO PEDIANO (planície) – Representante dos interesses dos Eupátridas, defendia posições conservadoras, a manutenção do controle político nas mãos dos círculos aristocráticos.
PARTIDO PARALIANO (litoral) – Satisfeitos com as reformas de Sólon, os comerciantes ricos defendiam um encaminhamento mais estável a situação política através da ampliação da sua participação na ocupação dos altos cargos públicos.
PARTIDO DIACRIANO (montanha) – Representando o interesse de thetas e georgóis, advogavam reformas profundas de cunho econômico, social e político.
Renascia, após um momentâneo período de tranqüilidade social, o conflito político de classes. Em 561 a.C., com ampla base de apoio popular e do exército, Pisístrato tomou o poder em Atenas estabelecendo a Tirania (ditadura).

A tirania
Na antiga Grécia, o termo tirano não tinha a conotação pejorativa que adquiriu nos dias de hoje: significava a tomada do poder pela força. O regime político instaurado em Atenas por Pisístrato caracterizava-se pelo poder pessoal do governante, que apoiado pelos grupos populares (Georgóis e Thetas) e pelas tropas, tomou o poder através de um golpe de Estado. Pode-se dizer que Pisístrato, que governou de 561 a 528 a.C., foi um tirano popular. O caráter progressista de seu governo lhe confere a condição de período de transição para a democracia.
De fato, seu governo foi extremamente importante para a cidade – Além de não extinguir a estrutura político-administrativa estabelecida por Sólon, o tirano realizou reformas de cunho sócio-econômico que tiveram importantes repercussões políticas. Dentre as realizações de Pisístrato, podemos destacar:
AS REALIZAÇÕES DE PISÍSTRATO
O enfraquecimento da aristocracia, através do confisco de parte substantiva de suas terras e a conseqüente redistribuição dessas áreas para os cidadãos mais pobres. Para os mais pobres, implantou um sistema estatal de crédito, que assim não necessitavam mais recorrer aos empréstimos dos eupátridas.
A montagem de uma poderosa frota naval, com o objetivo de estabelecer a hegemonia ateniense no mediterrâneo oriental e consolidar sua posição de potencia comercial.
A realização de inúmeras obras públicas (estaleiros, aquedutos, canais e templos) que criaram empregos para uma multidão de pobres e embelezaram a cidade.
Apoio a cultura. Atenas tornou-se centro da cultura grega, atraindo artistas e poetas em evidencia na Grécia.
Com suas reformas, Pisístrato além de consolidar o apoio das camadas populares, conseguiu atrair os comerciantes que se beneficiaram da dinamização que o comércio vivenciou em seu governo. Atenas, de cidade rural, foi transformada em potencia comercial e centro cultural. O comércio, o artesanato e os ofícios artísticos, praticados em escala cada vez maior, graças ao trabalho dos escravos, tornaram-se ramos predominantes na atividade produtiva. Assim, “O poder das famílias aristocráticas foi enfraquecido porque, em parte, a maioria delas foi banida e sua terra distribuída entre os cidadãos pobres, e, em parte, porque perderam totalmente a sua influencia e começaram a declinar, preparando o caminho para as instituições democrática do futuro. Quando a tirania caiu e foi preciso reconstruir a vida política, esta não foi baseada em uma aristocracia enfraquecida e desacreditada (somente em curtíssimo período), mas em uma democracia forte e consciente de sua força”. (ROSTOVTZEFF, M. História da Grécia. São Paulo, ZAHAR editores, 1991, pp. 106-107).
Com a morte de Pisístrato, seus filhos Hiparco e Hípias o sucederam no pode como péssimos tiranos. Pouco após a sucessão, uma conspiração aristocrática assassinou Hiparco, provocando a adoção de uma política intensamente repressiva por parte de Hípias. Essa atuação de Hípias causou uma progressiva perda de suas bases sociais de sustentação política, fato que acabou criando as condições necessárias para um movimento insurrecional que derrubou a tirania popular. Nesse contexto, quando se acentuava a guerra civil, assumiu o poder o eupátrida Hiságoras, buscando restabelecer o domínio oligárquico e dando início a uma grande perseguição aos líderes populares. A revolta foi geral: Hiságoras, num primeiro momento, tentou se aliar a Esparta. Os espartanos, por um curto período de tempo, chegaram a ocupar Atenas, mas logo foram expulsos. Todos esses fatos contribuíram para legitimar a ascensão política de Clístenes, o legislador da Democracia.

A democracia escravista ateniense
As reformas de Clístenes
O fundador da democracia em Atenas foi Clístenes. Suas reformas foram no sentido de divisão da Ática em cem províncias denominadas demos:
OS DEMOS DA ATENAS DEMOCRÁTICA
DEMOS DA CIDADE DE ATENAS - Agrupava os indivíduos dedicados as atividades de comércio e artesanato, além dos trabalhadores urbanos.
DEMOS DO LITORAL - Congregava pescadores e navegantes.
DEMOS DO INTERIOR - Reunia os grandes e pequenos proprietários rurais.
Cada grupo de dez demos formava uma tribo (com representantes dos três tipos de demos); o Conselho dos Quatrocentos foi transformado em Conselho dos Quinhentos, sendo que cada tribo fornecia cinqüenta representantes.
Ao mesmo tempo, foi realizada a reforma das instituições políticas:
A DEMOCRACIA DE ATENAS (REFORMAS INSTITUCIONAIS DE CLÍSTENES)
ARCONTADO – Passou a exercer apenas funções de natureza honorífica.
AREÓPAGO – Passou a exercer apenas o papel de tribunal religioso.
BULÉ (CONSELHO DOS 500) – Foi ampliado para 500 membros eleitos a razão de 50 membros por tribo. Sua principal função era preparar os projetos de lei que seriam votados irrevogavelmente pela Eclésia.
HELIEU – Transformou-se no supremo órgão judiciário e seus membros eram escolhidos por sorteio.
ECLÉSIA – A Assembléia popular. Foi transformada no supremo órgão de decisões em Atenas. Dela faziam parte todos os cidadãos de Atenas, ou seja, aqueles que fossem registrado no demos de origem, fossem filhos de pai ateniense e maiores de 18 anos. Da assembléia eram excluídos os estrangeiros, as mulheres e os escravos.
ESTRÁTEGOS (10) – Chefes militares eleitos anualmente pelas tribos.
INSTITUIÇÃO DO OSTRACISMO – Espécie de medida defensiva do Estado contra o ressurgimento dos regimes anteriores. Consistia no banimento, perda dos direitos políticos e confisco temporários de bens (por um período de 10 anos) de qualquer cidadão cuja atuação política fosse considerada uma ameaça a democracia. O ostracismo era votado, exclusivamente, na assembléia.
Pode-se dizer que Clístenes ampliou e aprofundou as reformas de Sólon, democratizando o sistema. Aos comerciantes, interessados em dirigir politicamente Atenas, era fundamental ampliar a sua base eleitoral que era conquistada voto a voto. Contudo. “A massa da população permaneceu miserável e os cidadãos que dela se originavam exerciam seu direito ao voto mediante compromissos com os que tinham posses. Como estes eram, agora, majoritariamente comerciantes, o exercício do poder político foi consolidado nas mãos dessa classe”. (ROSTOVTZEFF, M. OP. CIT. P. 121).
A democracia ateniense era uma democracia escravista e excludente: o trabalho escravo era a base da vida econômica da sociedade, e os escravos constituíam, senão a maioria, pelo menos uma parcela significativa da população da Ática. Os escravos não tinham qualquer direito político. Os estrangeiros, em geral comerciantes, só possuíam direitos civis e estavam excluídos da vida política. Já as mulheres não possuíam direitos políticos e tinham seus direitos limitados pelo pai ou pelo marido. “Nestas condições, a democracia ateniense, quando confrontada com as nossas modernas democracia, surge como uma oligarquia de fato, simplesmente menos restrita que uma oligarquia de direito. Mas as concepções modernas não nos fornecem uma medida adequada. Sua inadaptação, salta aos olhos no que diz respeito a escravidão, que todas as sociedades antigas admitiram como uma necessidade natural, uma realidade fundamental. Por definição, o cidadão deve gozar de sua liberdade pessoal: como imaginar-se o escravo tornando-se politicamente igual àquele que continuaria a ser seu senhor e como evitar esta monstruosidade (a escravidão) sem prejudicar a organização social?”. (AYMARD, A. e AUBOYER, J. O oriente e a Grécia antiga. In História geral das civilizações, Tomo I, 1º volume, São Paulo, DIFEL, 1955, p.124).
Em Atenas, a democracia era direta e não representativa. Noutros termos, as decisões políticas não eram tomadas por delegados ou representantes do povo, mas sim pelos cidadãos reunidos no Ágora (praça). Deve-se lembrar que, ao contrário do que ocorre nas atuais democracias ocidentais marcadas pelo conceito de “direitos dos cidadãos”, a democracia ateniense consistia no dever da participação de todos na vida política. Em síntese: hoje, os indivíduos reclamam seus direitos; na Atenas democrática, o indivíduo era obrigado a opinar sobre os assuntos da Polis. Daí o termo Política: a arte de bem conduzir a administração da cidade. As reformas realizadas por Clístenes reduziram os níveis de tensão social e contestação política anteriormente existentes.

(Fonte: FARIA, R. et alli. História. Belo Horizonte: Editora Lê, 1998, p. 34).

3d) O período clássico da História Grega (Séculos V e IV a.C.).
Do ponto de vista político interno, o período clássico de Atenas foi marcado pelo apogeu da democracia, em parte devido a liderança de Péricles, cujo governo – no século V a.C. – foi denominado de o “século de ouro”. Durante sua gestão (461 a 429 a.C.), o regime democrático ateniense baseou-se em dois princípios fundamentais: o da isonomia (normas iguais), que propunha a igualdade de todos perante a lei, e o da isocracia (poderes iguais), que consistia no direito da participação de todos os cidadãos nas decisões políticas. Como abordamos no capitulo anterior, a democracia ateniense era direta, enquanto hoje, nas sociedades ocidentais, prevalece a democracia exercida através de representantes. No tempo de Péricles, os cidadãos se reuniam na Ágora (praça) para conduzir os assuntos da Polis. O governo era, dessa maneira, “do cidadão e pelo cidadão”. As assembléias populares eram comícios ao ar livre que agrupavam todos os cidadãos masculinos maiores de 18 anos.
Péricles representava os interesses de amplas camadas do povo ateniense: comerciantes, artesãos, pequenos proprietários e grandes cultivadores de vinha e oliveira, cujos produtos destinavam-se ao comercio externo. Como líder do partido democrático ou popular, procurou realizar uma política que atendesse as reivindicações das camadas mais populares da sociedade. Nesse sentido foi empreendida uma serie de reformas que não alteraram o caráter de classe da sociedade: a democracia escravista saiu fortalecida. Essas reformas foram progressistas, na medida em que concederam maior espaço de ação política as camadas populares. “Durante seu governo instituiu-se a mistoforia, ou seja, a remuneração pelo desempenho de cargos públicos; além disso, soldados e marinheiros passaram a receber salários. Com vistas a assegurar a participação democrática de todos os cidadãos na vida publica, todos os funcionários (magistrados e outros), a exceção dos estrátegos, eram escolhidos por sorteio. Nessa época, o poder executivo era exercido de fato pelos estratégos e, entre eles, se sobressaía a figura de Péricles”. (AQUINO, Rubim Santos Leão de. OP. CIT. P. 200).
As decisões tomadas na Eclésia, representavam a palavra final nos tratados, na economia, no ordenamento jurídico, nas obras públicas, na paz e na guerra, em suma, em todas as atividades administrativas. As assembléias eram cotidianas e todos tinham o direito de fazer uso da palavra. Assim, a oratória tornou-se indispensável para o convencimento das massas. Se a Ágora era o espaço geográfico do poder, nele imperava o Logos (a palavra). A democracia ateniense, dessa maneira, gerou os demagogos (“demos”: povo; “gogos”: condutor), líderes que buscavam persuadir e seduzir politicamente a população. Os demagogos tinham como mestres os sofistas, os primeiros professores pagos na história da humanidade. A sofística, escola filosófica nascida em Atenas, defendia o relativismo do conhecimento: a verdade é aquilo que é útil para tomada e manutenção do poder.
Protágoras, o maior dos sofistas, resume essa postura ao afirmar que “o homem é a medida de todas as coisas, das que são enquanto são e das que não são enquanto não são”. Esse pragmatismo, aparentemente nocivo ao saber filosófico, tem a virtude política de defender a sociedade democrática, na qual prevalece a pluralidade de opiniões. De fato, a crença numa verdade absoluta sempre traz consigo a proposta de um Estado autoritário que imponha essa verdade.
A democracia ateniense, calcada na ação de todos, impossibilitava a criação de estruturas partidárias elitistas e concentradoras da autoridade. Outro fato importante do regime democrático de Atenas era a inexistência de grandes quadros burocráticos: poucos eram os funcionários públicos, limitados a alguns escriturários. Dessa forma, impedia-se a burocratização da sociedade com seu inevitável tráfego de influências. Foi o próprio Péricles, governante do auge da democracia ateniense, quem melhor ressaltou as virtudes do sistema: “Nossa constituição é chamada de democracia porque o poder está nas mãos não de uma minoria, mas de todo o povo. Quando se trata de resolver questões privadas, todos são iguais perante a lei, quando se trata de colocar uma pessoa diante de outra em posição de responsabilidade pública, o que vale não é o fato de pertencer a determinada classe, mas a competência real que o homem possui”. (Péricles).
No auge da democracia ateniense, a estrutura administrativa da cidade-estado de Atenas pode ser observada a partir do organograma abaixo:
Do ponto de vista econômico, a época clássica, se poucas alterações provocou na produção agropecuária, foi caracterizada pela expansão da produção artesanal e pelo incremento do comércio interno e externo.
Em Atenas, os bens eram vendidos, pelos produtores, diretamente aos consumidores e uma poderosa classe mercantil dedicava-se as importações e exportações. Como não podia deixar de ocorrer, o progresso mercantil provocou a ampliação da economia monetária. As dracmas (moeda grega) passaram a circular da Ásia Menor ao Mediterrâneo, onde as colônias forneciam cereais à Grécia e dela importavam manufaturas, azeite e vinho.
Todo esse crescimento econômico só foi possível devido a ampla utilização da mão-de-obra escrava, que trabalhava em todos os setores da produção em troca de moradia e alimentação. Além disso, serviam como mercadoria no comercio de Atenas com o mundo grego. Se para os cidadãos havia profundo respeito em relação a liberdade individual – dentro dos limites impostos pela lei -, para a imensa massa escrava, que constituía a maioria da população da Ática, não existia qualquer respeito as liberdades e direitos humanos. Alguns ideólogos da época procuraram até justificar a escravidão.
“(...) As propriedades são uma reunião de instrumentos e o escravo é uma propriedade instrumental animada (...) Se cada instrumento pudesse executar por si próprio a vontade e o pensamento do dono (...) os senhores não tinham necessidade de escravos (...).
Todos aqueles que nada tem de melhor para nos oferecer que o uso do seu corpo e dos seus membros são condenados pela natureza a escravidão. É melhor para eles servir que serem abandonados a si próprios. Numa palavra, é naturalmente escravo quem tem tão pouca alma e tão poucos meios que deve resolver-se a depender de outrem (...) o uso dos escravos e dos animais é aproximadamente o mesmo (...) a escravidão é justa.”. (ARISTÓTELES. A política. Cia. Editora Espasa, Calpe, Buenos Aires, 1972, págs. 30 e 32.).
A época clássica, apogeu da civilização grega, teve como característica fundamental a eclosão de duas grandes guerras: a primeira – denominada de Guerras Médicas – foi o confronto entre Atenas, liderando outras cidades gregas, contra os persas; a segunda consistiu num conflito interno – as Guerras do Peloponeso -, que foram travadas entre Atenas e Esparta.



As guerras médicas
No século VI a.C., as cidades gregas da Anatólia (Ásia Menor), assim como as da Magna Grécia (sul da Itália e Ilha da Sicília) apresentavam maior desenvolvimento econômico e cultural que as da própria Grécia. Destaque maior deve ser dado às principais Polis da Anatólia: Mileto, Éfeso, Samos e Lesbos, que eram, sem dúvida, os principais centros irradiadores da civilização helênica. O Reino da Lídia fazia fronteira com as cidades gregas da Anatólia e mantinha intensas relações comerciais com elas. Graças a esses contatos, a Lídia assimilou os padrões culturais da civilização helênica; em contrapartida, os lídios foram estabelecendo uma efetiva hegemonia política sobre toda a região da Anatólia. Esse domínio lídio é facilmente compreensível se levarmos em conta, não só a inexistência de uma unidade política entre as Polis gregas da área, como também as intensas rivalidades entre elas.
Em 548 a.C., Ciro, rei persa que levava adiante uma política imperialista, subjugou a Lídia e, por conseqüência, estabeleceu seu domínio político sobre a Anatólia. A presença persa não alterou, substancialmente, a vida da Anatólia; entretanto, mudou radicalmente os objetivos imperialistas persas, que passaram a participar do comércio mediterrâneo. A intromissão persa na área gerou, nas consciências dos líderes persas, a ambição de dominar a Península Balcânica. Esse objetivo era favorecido pela fragmentação política da Grécia e pelas freqüentes e intensas rivalidades entre suas Cidades-Estados. Dessa maneira, entre os séculos VI e V a.C., a expansão do Império Persa que já envolvera as colônias gregas da Ásia Menor, passou a ameaçar a própria Grécia Continental.
Entre 499 e 494 a.C., as cidades gregas da Anatólia, apoiadas por Atenas, revoltaram-se contra o domínio persa. “A revolta jônica (499-494 a.C.) Levou uma intervenção sobretudo simbólica de Atenas, em resposta ao pedido de ajuda; foram fornecidos vinte barcos e cinco outros de Eretria. Dario conseguiu debelar a revolta, e a frota grega foi vencida em uma batalha ao largo da ilha de Lade, em 494 a.C. Mileto foi tomada e saqueada pelos persas, que consolidaram seu domínio sobre as cidades jônica orientais. Em seguida, o monarca persa decidiu castigar Atenas e Eretria por terem apoiado a revolta, e enviou uma frota punitiva comandada por Mardonius, mas a expedição persa foi devastada por uma tempestade perto do monte Athos, obrigando mardonius a recuar.”. (JAGUARIBE, H. OP. CIT. P. .291).
Contudo, na seqüência, os persas conquistaram a Trácia e a Macedônia, cujo governo foi entregue, por Dario I, a Mardonius. As novas possessões serviriam de base de apoio para eventuais incursões no território grego. Estava montado o cenário da Primeira Guerra Médica: momento inicial de um conflito entre os imperialismos persa e ateniense em disputa pela Jônia, situada no litoral da Ásia Menor.
Montagem do cenário das Guerras Médicas.
1. Presença econômica e cultural grega na Anatólia.
2. Amplas relações comerciais e culturais entre as cidades gregas da Anatólia e o Reino da Lídia.
3. Helenização cultural da Lídia, que anexa político-militarmente a Anatólia.
4. A tomada da Lídia pelos persas, que estabelecem como objetivo o domínio da Península Balcânica, ameaçando a Grécia Continental.
5. Atenas, interessada em barrar os persas,apóia levantes das cidades gregas da Anatólia contra o dominador persa.
6. A retaliação dos persas é a conquista de áreas próximas a Atenas: a Macedônia e a Trácia, bases militares para o ataque ao território grego.

A primeira Guerra Médica
Em 490 a.C. os persas, sob o comando de Mardonius Artafernes e com o apoio de Hípias, tirano deposto em Atenas, iniciaram a invasão do sul da Grécia, fixando como objetivo primordial a conquista da Ática. Após a queda de Eretria, diante da iminente ameaça que recaia sobre a Ática, Miltíades, um dos dez estrátegos atenienses, propôs o enfrentamento com os persas em Maratona e obteve o comando no dia da batalha. Os persas tinham uma infantaria de 25 mil homens e uma temida cavalaria de mil homens enquanto que os atenienses contavam com apenas 15 mil hoplitas. Aproveitando uma ausência momentânea de cavalaria, Miltíades ordenou um ataque frontal dos hoplitas e obteve uma vitória esmagadora – os persas perderam 6.400 homens e os atenienses apenas 192. Os gregos, graças à vitória em Maratona, conseguiram rechaçar essa primeira tentativa de conquista empreendida pelos persas. Por dez anos, o Império Persa conheceu severos problemas internos: levantes no Egito e a morte de Dario I, criando um problema sucessório. Por essa razão, os gregos conheceram um período de trégua que possibilitou o aprimoramento do aparato militar.
Após a repressão da revolta egípcia e a escolha de Xerxes, filho de Dario, para sucedê-lo no trono, os persas organizaram uma segunda expedição que contava com aproximadamente 180 mil homens e uma frota naval de 730 barcos (JAGUARIBE, OP.CIT, P. 292) e que tinha como objetivo final a conquista dos Bálcãs. Os gregos, por sua vez, começaram a organizar a sua defesa formando uma liga de cidades, cujos representantes se reuniram em Corinto no ano 481 a.C., sob a presidência de Esparta. Mas o esforço para montar uma força pan-helênica não teve um êxito incontestável. A maioria das cidades do noroeste, os Aqueus do Peloponeso e Creta não se juntaram à liga. Os corcirianos prometeram ajudar, mas seus sessenta barcos não ultrapassaram o cabo Malea. Assim, o total das forças de defesa não ultrapassavam metade das forças atacantes.
A segunda Guerra Médica
Em 480 a.C., teve início a nova campanha persa contra os gregos, dessa vez sob a liderança de Xerxes. De imediato, a região de Tessália foi tomada, tendo início o avanço em direção a Atenas. Simultaneamente, a poderosa esquadra persa atravessou o Mar Egeu com objetivo de desembarcar tropas ao sul da Península Balcânica. A intenção de Xerxes era cercar Atenas, como primeiro passo para destruí-la. Esse projeto, no entanto, não ameaçava apenas a polis ateniense, pois os persas ameaçavam conquistar as cidades gregas que não os recebessem como aliados. Dessa forma, Esparta e cidades sob sua influencia, que preventivamente haviam participado da montagem da liga defensiva em 481 a.C., acabaram entrando diretamente no conflito ao lado de Atenas e contra os persas. Visando retardar a ofensiva inimiga, forças espartanas, encabeçadas pelo Rei Leônidas, foram enviadas para o desfiladeiro das Termópilas. Lá, 300 soldados de Esparta (com o apoio de cerca de 1000 Fócios e 300 Téspios) enfrentaram heroicamente milhares de persas. Relata-se que um general ateniense, ciente de que a derrota grega era inevitável em função do grande número de persas, disse a Leônidas: “não podemos vencer, pois os persas são tantos que suas lanças cobrirão o sol”. O comandante espartano respondeu: “melhor, lutaremos à sombra” (existem outras versões para esse diálogo). Até hoje, nas Termópilas, existe uma inscrição que reza: “um general espartano sabe morrer”. Apesar da tenaz resistência grega, os persas, obviamente, saíram vitoriosos, rumando para Atenas, que foi incendiada enquanto sua população fugia para a Baía de Salamina. Os atenienses, contudo, prepararam uma poderosa esquadra barcos leves, com o objetivo de evitar o desembarque persa: trava-se a batalha naval de Salamina. Sob o comando de Temístocles, os pequenos e rápidos navios gregos atraíram os pesados navios persas para as águas rasas da Baía, afundando-os. A derrota persa significou a hegemonia naval grega. Agora, as tropas médicas no continente grego, desprovidas de suprimentos, ficaram isoladas na região da Beócia.
Em 479 a.C., os persas tentaram uma derradeira investida, sendo derrotados pelos espartanos, sob o comando de Pausânias, na batalha de Platéia e pelos atenienses na região de Mícala. Diante dessas duas derrotas, os persas tiveram de desistir definitivamente da conquista da Grécia, já que seus exércitos e sua esquadra foram quase que totalmente destruídos.

A Confederação de Delos (467 – 449 A.C.)
No final da guerra, Atenas era a Cidade-Estado em melhores condições para exercer a hegemonia entre os gregos. Além de possuir a maior frota naval do Mar Egeu e um poderoso exército, Atenas, após as reformas de Clístenes, vivia uma relativa paz social e, em razão dos sucessos nas Guerras Médicas, seu sentimento nacional estava vivo e forte. Para as cidades gregas da Anatólia e da Ilhas do Egeu, era vital a continuidade das lutas contra o Império Persa. Assim, não foi difícil para Atenas, acatando a sugestão do general Aristides, propor e conseguir a formação de uma união militar permanente entre as cidades gregas – a Confederação de Delos (Em outros termos, dar um caráter permanente a antiga liga defensiva). Essa agregava todas as cidades circundantes do Egeu e Anatólia sob a liderança de Atenas, mas não contava com Esparta. Cada Polis dela participante devia contribuir com tropas, navios e dinheiro, com o objetivo de recrutar tropas e equipar a marinha. Todos esses recursos seriam depositados na Ilha de Delos, sede da Confederação.
Por ser a mais rica dentre as Cidades-Estados gregas, Atenas passou a utilizar a Confederação de Delos para impor sua hegemonia. Os gregos, fortalecidos pela reunião de várias Polis, venceram os persas sob o comando do ateniense Címon e impuseram a Paz de Calias (449 A.C.), que reconhecia a hegemonia grega no Mar Egeu.

O imperialismo ateniense
Em conseqüência das Guerras Médicas e através da Liga de Delos, Atenas passou a ser a potência política, militar e economicamente dominante em todo o Mediterrâneo Oriental. Essa situação acelerou o ritmo do desenvolvimento mercantil em Atenas, provocando o crescimento de sua população pela chegada de inúmeros metecos (estrangeiros) e pela ampla difusão do trabalho escravo. Noutros termos, a Liga de Delos, inicialmente criada para enfrentar os persas, agora se transformava no instrumento do imperialismo ateniense. Muitas cidades gregas, vítimas da opressão ateniense, procuraram retirar-se da Confederação: levantes e mais levantes contra Atenas proliferaram em solo grego, sendo cruelmente abafados. Essa vocação imperial de Atenas começou a inquietar Esparta. “(...) Celebrada a paz, a liga não foi dissolvida, pois muitos gregos temiam que os persas voltassem. Com o correr dos tempos, Atenas paulatinamente transformou-a em um império naval para a promoção dos seus próprios interesses. Usou parte dos fundos do tesouro para fins particulares seus. Tentou reduzir todos os outros membros a condição de vassalos e, quando um deles se rebelava, dominava-o pela força, apoderava-se de sua esquadra e impunha-lhe tributos como se fosse um pais conquistado. Tais métodos arrogantes despertaram as suspeitas dos espartanos, que temiam que a hegemonia ateniense em breve viesse a estender-se sobre toda a Grécia.”. (BURNS, EDWARD McNALL. OP. CIT. P.102).
Internamente, Atenas, graças aos recursos obtidos por intermédio da Confederação de Delos, atingiu o apogeu. Ao longo do governo de Péricles, as artes se desenvolveram, muralhas defensivas foram construídas no Porto do Pireu e multiplicaram-se as obras públicas.
As ambições imperiais de Atenas, a crueldade de sua dominação e os pesados tributos impostos às cidades agrupadas na Liga de Delos provocariam um conflito interno: as Guerras do Peloponeso.

As Guerras do Peloponeso
A hegemonia ateniense sobre a Grécia negava a concepção política do particularismo das Cidades-Estados. A idéia de nacionalidade, para os antigos gregos, estava ligada à sua Polis de origem e não ao conceito de nação. Em suma: a ação centralizadora de Atenas opunha-se à noção de Polis. Os desejos imperiais de Atenas enfrentavam forte oposição por parte das principais cidades-estados da Grécia, principalmente no que dizia respeito à Esparta e suas aliadas, que formaram a Liga do Peloponeso, para combater a Confederação de Delos.

“Uma segunda causa pode ser encontrada nas diferenças sociais e culturais entre Atenas e Esparta. Atenas era democrática, progressista urbana, imperialista e avançada intelectual e artisticamente. Esparta era aristocrática, conservadora, agrária, provinciana e culturalmente atrasada. Onde esses sistemas contrastantes coexistem lado a lado, e quase impossível impedir conflitos. Entre atenienses e espartanos já reinava, desde algum tempo, uma atitude de hostilidade. Os primeiros consideravam os segundos bárbaros rudes. Os espartanos acusavam os atenienses de tentarem exercer domínio sobre os Estados ao norte do Peloponeso e de encorajar os hilotas a rebelião. Fatores econômicos também desempenharam papel importante na eclosão do conflito. Os atenienses ambicionavam dominar o golfo de Corinto, a principal rota de comércio com a Sicília e o sul da Itália. Isso tornava Atenas inimiga mortal de Corinto, o principal aliado de Esparta.”. (BURNS, OP.CIT, P.192)
O apoio ateniense ao levante de Córcira, colônia de Corinto, foi o estopim para que toda a Confederação do Peloponeso entrasse em guerra com Atenas. Em 431 a.C., tinha início a Guerra do Peloponeso, que duraria 28 anos.
Na primeira fase do conflito, de 431 a 421 a.C., houve um relativo equilíbrio entre atenienses e espartanos. Nesse período, Esparta e seus aliados bloquearam, por terra, a Ática, forçando Atenas a buscar suprimentos por mar, principalmente na Ásia Menor. Tal bloqueio fez com que a população da Ática fosse concentrada no interior dos muros de Atenas. Isso, além de dificultar o abastecimento dos atenienses, piorou as condições sanitárias de Atenas, propiciando a ocorrência de várias epidemias que vitimaram grandes contingentes humanos, inclusive Péricles.
Em 421 a.C., foi assinada a Paz de Nícias, que deveria ser mantida por 50 anos. Entretanto, Atenas retomou sua política imperialista e elaborou planos para atacar Siracusa. Tal proposta, concebida pelo general Alcebíades, enfrentou feroz oposição dos aristocratas de Atenas, simpáticos à causa espartana. Irritado, Alcebíades refugiou-se em Esparta, onde delatou os planos atenienses que, por essa razão, fracassaram. Em represália, Esparta desfechou uma poderosa ofensiva que, após impor inúmeras derrotas à Atenas, culminou, em 404 a.C., com a vitória definitiva de Esparta na batalha de Égos - Pótamus. “Os termos impostos aos atenienses foram bastante duros: destruição de suas fortificações, entrega de todas as possessões estrangeiras, e praticamente toda a marinha, e submissão a Esparta como Estado dependente. Embora Atenas recuperasse por algum tempo, sua primazia no século IV a.C., seu período de gloria já chegava ao fim.”. (BURNS, OP.CIT, P.193)
A derrota de Atenas significou o início da hegemonia espartana sobre a Grécia. Em primeiro lugar, as elites espartanas destruíram a democracia ateniense, impondo o regime dos 30 tiranos; além disso, Esparta buscou estabelecer seu império através de uma crescente intervenção nos assuntos internos das outras cidades-estados. O expansionismo espartano, cuja ambição agora era controlar o comércio do mediterrâneo oriental, levou a novos choques com o Império Persa. Pouco a pouco, Esparta conheceu uma desestabilização interna. O crescimento do número de seus escravos, sempre dispostos a levantes, provocou novas necessidades militares destinadas a preservar a dominação política dos esparciatas. Na Anatólia, o recuo dos espartanos possibilitou a retomada da região pelo Império Persa. O enfraquecimento de Esparta fez com que Atenas e Tebas se aliassem, buscando aniquilar a hegemonia então exercida pelos militaristas espartanos. Em 371 a.C., na batalha de Leuctras, os tebanos, comandados por Pelópidas e Epaminondas, expulsaram as tropas espartanas da Grécia Setentrional. Logo em seguida, a cidade de Tebas apoiou a independência da Messênia em relação à Esparta e conquistou a Tessália. Tinha início à curta hegemonia tebana sobre a Grécia. Em 362 a.C., Atenas e Esparta aliaram-se e derrotaram Tebas.
As lutas internas desorganizaram o mundo grego: nenhuma Polis tinha mais condições de impor sua hegemonia a Grécia, que foi vítima de um “vazio de poder”. Como bem observam os analistas das relações internacionais, a política detesta o “vazio”, pois sempre alguma nação vai ocupá-lo. Era chegada a vez dos macedônios.
“A guerra do Peloponeso não só pos fim a supremacia de Atenas, como destruiu a liberdade de todo o mundo grego e assinalou a ruína do gênio político helênico. Depois da guerra, Esparta consolidou o seu poder em toda a Grécia. Oligarquias garantidas por tropas espartanas substituíram as democracias onde quer que existam. O confisco de propriedades e o assassínio eram os métodos comumente empregados para combater a oposição. Embora em Atenas, depois de certo tempo, fossem destituídos os tiranos e restaurado o governo livre, Esparta pode dominar o resto da Grécia por mais de trinta anos. Em 371 a.C., entretanto, Epaminondas de Tebas, destroçou o exército espartano em Leuctras, iniciando assim um período de supremacia tebana. Infelizmente, Tebas mostrou-se pouco mais sábia e tolerante no governo do que Esparta, e nove anos depois foi liderada uma nova coligação para libertar as cidades gregas de seu novo opressor. Não conseguindo dissolver a aliança, os tebanos deram-lhe batalha no campo de Martinéia. Ambos os lados proclamaram vitória, mas Epaminondas foi morto e, logo depois, seu Império eclipsou-se.
A longa serie de guerras tinha levado os estados gregos à exaustão. Embora permanecesse ainda intacta a sua cultura, politicamente estavam prostrados e indefesos. Seu destino foi em breve decidido pelo surgimento de Felipe da Macedônia. Exceto quanto a um ligeiro verniz de cultura helênica, os macedônios eram bárbaros, mas Felipe, antes de se tornar seu Rei, aprendera a comandar um exercito no tempo em que fora refém entre os tebanos. Percebendo a fraqueza dos Estados do Sul, resolveu conquista-los. Uma seqüência de rápidos sucessos culminou na vitória decisiva em 338 a.C., e logo depois no domínio de toda a Grécia, com exceção de Esparta. Dois anos depois, Felipe seria assassinado em conseqüência de uma rixa familiar.”. (BURNS, OP.CIT, PP. 103 - 104).

3e) O Período Helenístico
A Macedônia, localizada no norte da Grécia, aproveitou-se do enfraquecimento grego e seu rei Filipe II, admirador da cultura grega, preparou um poderoso exército com o objetivo de conquistar o território helênico. De início, Filipe II buscou fomentar as rivalidades entre as cidades gregas; em seguida, subornou as elites helênicas. Uma das mais famosas frases do rei macedônico explicava sua política: “não há fortaleza que resista a um burro carregado de ouro”. Essas atitudes de Filipe II provocaram a reação do mais famoso orador grego, que por sinal era gago, Demóstenes, que em seus discursos, conhecidos como Filípicas tentou alertar o povo contra as intenções do rei da Macedônia. Em 338 a.C., as falanges macedônicas venceram os gregos na batalha de Queronéia. A Grécia perdia sua independência e tinha início o período Helenístico.
O Império macedônico na época de Alexandre Magno.
O expansionismo iniciado por Filipe II teve continuidade com seu filho Alexandre Magno, que consolidou a dominação da Grécia e conquistou praticamente todas as regiões compreendidas entre o Egito e o Império Persa.
Alexandre magno.
A Macedônia tornou-se o maior império até então formado, que só seria suplantado por Roma, séculos depois. Com muita habilidade, Alexandre respeitou as instituições políticas e religiosas e fomentou matrimônios entre seus assessores e moças das elites das regiões conquistadas. Ele próprio se casou com uma nobre persa. Atuando dessa maneira, Alexandre, que se apresentava como libertador das regiões conquistadas evitou levantes que pudessem solapar seu expansionismo. O imperialismo macedônico levou a cultura grega à África, ao Oriente Médio e à Ásia Menor; paralelamente trouxe dessas regiões influências culturais. Essa fusão de culturas gerou o Helenismo, que teve como centros as cidades de Pérgamo e Alexandria. Em síntese: o helenismo foi essa mescla de culturas, do Ocidente e do Oriente, que gerou uma nova realidade cultural de cunho misto e sincrético.
Após a morte de Alexandre, seu império foi dividido em três partes: o Reino da Síria, abrangendo a Ásia Menor, a Síria e a Mesopotâmia, controlado pela dinastia Selêucida; o Reino do Egito, compreendendo, além do próprio Egito, a Arábia e parte da Palestina, sob dominação da família dos Ptolomeus; e o Reino da Macedônia, englobando a Grécia e sob o controle do general Antígono. A Índia e a Pérsia readquiriram sua independência.
O mundo grego, em seguida, seria conquistado pelos romanos; ao longo da Idade Média seria a sede do Império Bizantino; depois, faria parte do Império Turco – Otomano, recuperando sua plena autonomia somente em meados do século XIX.
“O significado básico das façanhas militares de Alexandre está no fato de ele haver levado o impulso helênico até a Ásia, mais longe e mais depressa do que teria ocorrido de outra maneira. É indubitável que ele fez com que a influencia grega fosse exercida mais amplamente. Ao mesmo tempo ele parece ter imposto um esforço exagerado sobre o helenismo com resultado de encorajar uma violenta maré de influencias orientais sobre o ocidente. Dentro de pouco tempo as culturas helênica e oriental interpenetravam-se de tal modo que se produziu uma nova civilização. Foi esta a civilização helenística...”. (BURNS, OP.CIT, P. 103).

p.s Favor desculpar a ausência dos Mapas, tenho uma relação meio conflituosa com a tecnologia.
abraço, KBSA.

Revolução Industrial PRÉ e SEGUNDO ANO. Colégio PADRÃO

A revolução industrial

Revolução ou revoluções?
Por Revolução Industrial convencionou-se designar o processo de transformações econômicas e sociais, caracterizadas pela aceleração do processo produtivo e pela consolidação da produção capitalista. Tal processo assinala, ainda, a passagem em definitivo da produção baseada em relações feudais para a produção em que o capital e o trabalho estão definitivamente separados, isto é, a produção capitalista.
Em sentido restrito, podemos afirmar que: a Revolução Industrial foi um processo de renovação na cultura da produção de riquezas, ou seja, nos processos a partir dos quais os homens transformam a natureza em seu benefício. Se, para a historiografia mais comum a respeito desse processo, o fator básico condicionante da revolução industrial foi a invenção da máquina ou, mais genericamente, a mecanização da indústria, não se pode deixar de reconhecer que, para que essa transformação acontecesse, os homens nela envolvidos tiveram que passar a encarar de uma forma completamente diferente os meios pelos quais eles obtiveram capital, mão de obra, matérias-primas, legislação favorável, apoio social e político e muitos outros fundamentos que foram essenciais na introdução e consolidação do sistema industrial.
A partir dessa concepção, podemos formular a idéia de que a Revolução Industrial significou uma alteração radical na disponibilidade dos Meios e formas da Produção o que, em termos conclusivos, equivale afirmar a existência de uma nova disponibilidade dos meios de produção, de novas relações sociais de produção e de outras políticas organizativas da produção e dos sujeitos que a realizam. Contudo, esse não foi um processo que ocorreu abruptamente e, tão pouco teve nas suas transformações meramente econômicas, o motor de todas as mudanças. A Inglaterra do século XVIII foi, em grande medida, fruto da Inglaterra dos séculos XVI e XVII, período em que aconteceram importantes transformações na cultura, nas mentalidades e, partir dessas, nas próprias estruturas econômicas e sociais. Dentro dessa linha de raciocínio, podemos concluir que a Revolução Industrial foi um processo resultante de várias revoluções que se encontraram – um processo de mudanças parciais que, juntas, operaram uma alteração radical nas estruturas da civilização.

O pioneirismo inglês
Em termos de Revolução Industrial, a Inglaterra precedeu o resto do mundo em cerca de um século. Nesta medida, nosso estudo sobre esse evento deve ser iniciado com a abordagem do problema específico da Inglaterra na segunda metade do século XVIII ou das origens da industrialização. Primeiro vamos investigar esse fato.
A história da Inglaterra na Idade Moderna é inteiramente dominada pelo desenvolvimento do comércio marítimo. Trata-se de um comércio fundamentalmente de intermediação: os ingleses desembarcavam, em seus portos, produtos ultramarinos e depois os distribuíam pela Europa. Além disso, vendiam no Báltico os produtos adquiridos no Mediterrâneo e vice-versa. Os ingleses também tendiam a substituir os holandeses nos transportes de mercadorias para outros Estados, ou seja, havia uma grande frota inglesa que navegava pelo mundo prestando serviços a outras bandeiras. Havia ainda o comércio praticado pelos ingleses, que dizia respeito à exportação de seus próprios produtos: ao lado dos manufaturados, principalmente tecidos, o trigo, embora com uma participação cada vez menor, e a hulha (carvão mineral).
Segundo levantamentos estatísticos feitos por alguns historiadores, no final do século XVIII o controle da Inglaterra sobre o comércio internacional era tal que de cada dez navios mercantes existentes no mundo nove eram ingleses.
O Estado inglês aplicava uma política econômica mercantilista, a economia era orientada no sentido de atingir ao máximo a auto-suficiência do país: importar o mínimo possível e exportar o máximo era a regra. Uma Balança Comercial altamente favorável e a abundância dos metais preciosos eram os indícios da prosperidade. O Estado agia junto à economia através de suas leis, seus regulamentos e sua política. A pirataria no século XVI, a vitória contra a Espanha ao final desse mesmo século, os Atos de Navegação de 1651, elaborados por Oliver Cromwell, a subjugação da Holanda em 1654 e as gestões diplomáticas que viabilizaram tratados comerciais vantajosos, reservaram aos barcos ingleses parte considerável do comércio marítimo mundial.
Essa hegemonia marítimo-comercial da Inglaterra conferia-lhe uma condição singular em termos de acumulação de capital. Por exemplo, a essa hegemonia a Inglaterra deve o fato de haver podido assinar com Portugal, em 1703, o Tratado de Methuen, em função do qual uma grande parte do ouro explorado no Brasil, no século XVIII, foi acabar nos cofres ingleses.
O fato é que, ao final do século XVIII, a Inglaterra possuía maior acumulação de capital que qualquer outro país europeu e, por que não, do mundo.
O grande desenvolvimento do comércio internacional e das manufaturas, principalmente no setor têxtil, provocou uma mudança radical no sistema de exploração agrária da Inglaterra. Havia uma crescente demanda de lá para a indústria, assim como de trigo e de carne para as cidades que se encontravam em pleno desenvolvimento.
A burguesia, ao adquirir os domínios senhoriais pretendia, como não poderia deixar de ser, tirar o máximo proveito deles. A nobreza, por seu turno, não manifestava em relação às atividades lucrativas o mesmo preconceito da aristocracia francesa, que via nessas atividades uma prática deselegante para o seu “status”. “A revolução, porém, necessitava de alguma coisa mais, além de dinheiro. Exigia hábitos mentais que encorajassem investimentos em atividades arriscadas, mas que encerravam enormes possibilidades de lucro. Na Inglaterra, muito mais que no continente, a busca da riqueza era vista como um digno objetivo de vida. A partir da renascença, a aristocracia continental (França, por exemplo) havia cultivado a idéia de conduta ‘cavalheiresca’, em parte para se proteger dos avanços sociais que vinham de baixo. Os aristocratas ingleses, cujos privilégios eram modestos em comparação com os dos nobres do continente, nunca deixaram de respeitar aqueles que ganhavam dinheiro; tampouco se esquivam a ganhar eles próprios o que pudessem. Investiam e especulavam. A pressa que se deram para cercar suas terras refletia essa simpatia pelo capitalismo agressivo. Abaixo da aristocracia, era ainda mais tênue a barreira que separava os comerciantes urbanos da ‘nobreza’ rural. Na maioria, os homens que atuaram como pioneiros nos primeiros anos da revolução industrial vinham da pequena nobreza ou da classe dos yoemen. A um grau desconhecido no continente, homens com esse tipo de antecedentes sentiam-se a vontade para subir até onde os levassem, na escala social e econômica, as suas aptidões.”. (BURNS, op. cit. p. 515).
Até então, a estrutura agrária inglesa não era favorável à exploração intensiva e racional. O regime predominante ainda era o dos campos abertos (“open fields”), ou seja, os campos de cultura não eram cercados. Os rendeiros hereditários eram considerados da terra, embora fossem mantidos os direitos eminentes da propriedade para os senhores. Cada rendeiro dispunha de diversas faixas de terras descontínuas, que eram exploradas por ele simultaneamente. Com o objetivo de aumentar a rentabilidade agrária, a burguesia e a nobreza passaram a cercar os seus campos (“enclosures”), agregando-se em lotes contínuos. Mesmo as glebas comunais foram submetidas ao sistema de “enclosures”. Nessas circunstâncias, porém, os rendeiros ficaram, na maior parte dos casos, arruinados, pois receberam as piores áreas, além de pagarem as despesas com o cercamento e de não mais poderem levar o seu gado para pastar naquilo que outrora haviam sido terras comunais. Aos rendeiros, tornou-se impossível fazer frente à concorrência dos grandes proprietários que, por disporem de maior volume de capital, tinham melhores condições de aplicar as novas técnicas agrárias. Dessa forma, os rendeiros eram obrigados a repassar as terras que ocupavam aos latifundiários, transformando-se em proletariado agrícola ou, o que era mais freqüente, migrando para a cidade. Além desse fenômeno, há de se considerar ainda que, de um predomínio da atividade cerealista, passou-se ao predomínio do pastoreio de ovelhas, fato que, por si só, já significou uma liberação da mão-de-obra, forçada a emigrar para as cidades, a fim de fugir do desemprego rural. Em resumo, a ocorrência dos cercamentos gerou a disponibilidade de mão-de-obra para que as indústrias pudessem conhecer o seu desenvolvimento, lançando mão de uma massa trabalhadora abundante e barata.
Assim, na Inglaterra, a aristocracia fez-se burguesa, ou seja, preocupada com a racionalização da produção e com a comercialização dos produtos. Muitas vezes, inclusive, ela passou da exploração do solo à das minas. Além disso, com o direito de transmissão de herança por primogenitura, que era extremamente rígido, os secundogênitos das grandes famílias proprietárias de terras entregavam-se, cada vez mais, ao comércio e às finanças.
Face a todas essas realidades, verificamos que foi diminuindo a distância entre a nobreza agrária e a burguesia e, conseqüentemente, o comércio, por intermédio da sociedade que ajudou a criar, dirigia a vida administrativa e política da Inglaterra desde o final do século XVII.
Politicamente, a Inglaterra era uma monarquia constitucional com um rei e duas câmaras que se constituíam em órgãos representativos da elite econômica e financeira da Inglaterra. A Câmara dos Lordes era composta dos grandes senhores, dos lordes hereditários, dos bispos da Igreja Anglicana e dos lordes que o Rei podia nomear a seu bel-prazer e que eram, via de regra, recrutados entre os homens mais ricos do país. A Câmara dos Comuns era composta de deputados eleitos pelas cidades e pelos condados através do sufrágio censitário, de forma que só os ricos acabavam podendo participar do processo eleitoral, quer seja como eleitores, ou como candidatos. Em resumo, a vida política inglesa do século XVIII era absolutamente coerente com os interesses das camadas sociais economicamente dominantes.
Se quisermos sistematizar a realidade inglesa no século XVII, poderemos fazê-lo nos seguintes termos:
· Face ao seu domínio dos mares e do comércio internacional, a Inglaterra era o país que mais amplos mercados consumidores controlava.
· Em função do domínio do comércio mundial, a Inglaterra era o país que maiores capitais havia acumulado.
· Devido aos “enclosures”, a Inglaterra possuía, no século XVIII, abundante disponibilidade de mão-de-obra urbana.
· A Inglaterra, em função do processo de suas revoluções políticas do século XVII, mais do que qualquer outro país europeu, apresentava uma estrutura política adequada aos interesses do desenvolvimento industrial.

As inovações técnicas
Além de todas essas condições já apontadas, há de se mencionar ainda que a Inglaterra foi palco de alguns dos progressos tecnológicos mais importantes do primeiro momento da Revolução Industrial: em termos tecnológicos, o fato maior da Revolução Industrial, no século XVIII, foi a invenção do Motor a Vapor, realizada por Newcomen e, posteriormente, aperfeiçoada por James Watt, que registrou a patente de seu motor a vapor em 1769. O motor a vapor foi a primeira forma regular e estável de obtenção de energia inventada pelo homem, e boa parte dos demais progressos técnicos da Revolução Industrial, na Inglaterra, constituíram-se em simples agregações do motor a vapor às ferramentas já existentes.
As máquinas em particular, e as invenções técnicas em geral, nascem de um desequilíbrio econômico e da necessidade de reduzir os custos e aumentar a eficiência da produção. Por sua vez, cada invento cria um novo desequilíbrio econômico e determina a procura de novos inventos. Ilustremos o raciocínio acima formulado através do exemplo da indústria têxtil inglesa no século XVIII:
· Desde o início da utilização da “lançadeira volante”, havia acontecido uma grande aceleração na produção de tecidos; entretanto, como os fios continuavam a ser produzidos manualmente nas rodas de fiar, havia um desequilíbrio entre a oferta e a procura pelos fios, ou seja, a demanda de fios era muito maior do que a sua produção. Os tecelões tinham problemas especialmente no verão, quando boa parte dos fiandeiros, em busca de melhores rendimentos, dedicava-se às colheitas. Os comerciantes que haviam recebido encomendas confiando na produtividade dos teares munidos de lançadeiras volantes não podiam honrar seus compromissos em função da falta de fios, o que fazia com que eles colocassem boa parte dos tecelões em desemprego, além de perderem sua clientela.
· Essa crise da produção têxtil tornou-se aguda a partir de 1763, em função dos novos mercados conseguidos no Oriente pela Inglaterra através da Guerra dos Sete Anos. Tal situação estimulou James Hargreaves a incrementar suas pesquisas, que resultaram na invenção da “jenny”, uma máquina que permitia ao fiador produzir até oitenta fios de cada vez; entretanto, o fio produzido pela “jenny” era pouco resistente e partia com facilidade na hora da tecelagem. Para resolver essa deficiência, Samuel Crompton, em 1779, inventou a “mule”, nova máquina de fiar que tinha a mesma produtividade que a “jenny”, mas cujo produto era mais resistente.
· Com a invenção de Crompton, a fiação ficou à frente da tecelagem, ou seja, esta não era capaz de consumir toda a produção daquela, pois, apesar da lançadeira volante, o tecelão continuava a trabalhar manualmente. É nessa perspectiva que encontramos os esforços de Cartwright que, em 1875, inventou o tear mecânico. A partir da invenção de Cartwright, configurou-se a seguinte situação: dois teares mecânicos operados por um rapaz de quinze anos teciam três peças e meia de pano por dia, enquanto que um artesão, por mais hábil que fosse no uso da lançadeira volante, não conseguia produzir mais do que uma peça por dia. Destarte, o fio produzido mecanicamente passou a poder ser consumido, o preço dos tecidos baixou e, conseqüentemente, a clientela aumentou. James Watt, aperfeiçoando a máquina a vapor, chegou à máquina de movi­mento duplo, com biela e manivela, que transformava o movimento linear do pistão em movimento circular, adaptando-se ao tear.
Outro setor industrial que conheceu novos processos na Inglaterra do século XVIII foi a metalurgia, sendo que neste setor o fato mais significativo foi a descoberta do processo de fundição do ferro através do uso do coque. Com a generalização do uso da energia a vapor e dos processos de fundição através do coque, o carvão mineral valorizou-se extremamente como matéria-prima industrial. Este fato é mais um elemento a justificar o pioneirismo inglês na Revolução Industrial, pois na Inglaterra havia abundante reserva de carvão mineral. Aliás, a crescente importância do carvão mineral para a produção industrial condicionou a própria localização geográfica da indústria inglesa, que vai se concentrar principalmente nas regiões carboníferas.

Aspectos tecnológicos
O aparecimento das máquinas não significa apenas um progresso técnico, através do qual se verificou um aumento da produtividade. A introdução das máquinas na produção industrial significou uma substituição do tipo de equipamento que era utilizado até então, ou seja, as ferramentas, e uma liberação da mão-de-obra. A máquina substituiu o homem parcialmente como recurso de produção sob dois aspectos:
- Trabalhador direto não-qualificado, ou seja, aquele cuja contribuição exclusiva para a produção era o seu dispêndio de força física, foi, na maioria das operações, substituído pelas fontes de energia não-humanas.
- Determinadas tarefas, que na época do trabalho manufatureiro dependiam de um certo número de trabalhadores diretos, com a invenção das máquinas passaram a depender de um número bastante menor de trabalhadores diretos.
O fato de a máquina ocupar parcialmente o lugar da mão-de-obra significa uma desvalorização desta, sendo que desvalorização de mão-de-obra se traduz por baixos salários.
Um aspecto adicional da mecanização da indústria é o de que muitas das tarefas para as quais anteriormente a força do homem era vital agora poderiam ser exercidas por mulheres ou por crianças. Devido a essa realidade, verificamos uma crescente utilização da mão-de-obra feminina e infantil, submetidas a níveis de remuneração ainda mais baixos.
De início, deve ficar claro que “oficina”, “manufatura” e “fábrica” são tipos diferentes de unidades de produção industrial. A oficina é a unidade de produção industrial na qual os meios de produção são de propriedade do trabalhador direto que, desta forma, exerce um efetivo controle, não só sobre a produção, como também sobre a comercialização dos produtos. A oficina foi a unidade de produção industrial predominante na Idade Média.
Com o desenvolvimento do comércio à longa distância, especialmente a partir das Grandes Navegações e Descobertas dos séculos XV e XVI, dois novos fatos passam a ser considerados na sistemática da produção industrial:
- Em função da incorporação de novos mercados consumidores, verificou-se um substancial aumento na demanda de produtos industrializados.
- O comércio deixou de ter a dimensão local que permitia ao próprio trabalhador direto industrial realizar as operações de comercialização do produto.
Impulsionado por todas essas mudanças, verificamos que, entre o produtor e o consumidor, vai ser necessário a existência de um intermediário, ou seja, o burguês, comerciante. Muitas vezes, o burguês comerciante ganhou também o papel de empresário, ou seja, passou a fornecer a matéria-prima e, ele mesmo, chegou a ser o proprietário das instalações onde se desenvolve a produção e, por isso tudo, terá a função de realizar a comercialização do produto final. Nesta situação, o trabalhador direto, que continua dono de suas ferramentas, é contratado para a execução de certas tarefas para o burguês empresário. Este tipo de unidade de produção industrial é chamado de manufatura.
Observe-se que na manufatura existe uma primeira separação entre o trabalhador direto e a propriedade dos meios de produção, pois uma parte desses meios de produção passa a pertencer à burguesia. A forma pela qual a burguesia participa do processo de produção faz com que seja em suas mãos a verificação efetiva do chamado processo de acumulação de capitais.
Foram exatamente os capitais acumulados durante o período manufatureiro que permitiram à burguesia concentrar totalmente em suas mãos a propriedade dos meios de produção a partir da Revolução Industrial.
A fábrica é a unidade de produção industrial na qual o trabalhador direto não tem de forma alguma a propriedade de qualquer dos meios de produção. Por outras palavras, na fábrica existe uma total e efetiva separação entre o trabalhador direto e a propriedade dos meios de produção.
No sistema fabril, o trabalhador direto é dono de sua força de trabalho e por isso é obrigado a vendê-la ao proprietário dos meios de produção em troca de uma remuneração periódica chamada salário. A instalação de uma fábrica pressupõe a realização de um investimento sob a forma de instalações, máquinas, grandes quantidades de matéria-prima, contratação de mão-de-obra etc. Para a realização desse investimento, era necessária a existência de uma acumulação de capital, sendo que este fato alijava a grande maioria dos trabalhadores diretos da propriedade dos meios de produção que, por sua vez, passariam a estar concentrados nas mão da burguesia, já que esta era a detentora principal dos capitais acumulados durante a Idade Moderna.

O sistema de fábrica: uma nova forma de trabalho
A criação das máquinas em si não assustou os artesãos em vez que alguns aperfeiçoamentos poderiam ser perfeitamente absorvidos pelo sistema familiar de produção. As máquinas pequenas serviam para atualizar a produção nas oficinas e para facilitar determinadas etapas da produção. Quando se intensificou o estímulo às invenções técnicas, muitos mestres-artesãos aproveitaram para dar uma contribuição sobre seu ofício.
Ocorre que os comerciantes queriam substituir as oficinas caseiras pelos grandes galpões onde os trabalhadores tinham hora para entrar e para sair e onde tinham de trabalhar no ritmo acelerado que o patrão impunha. Uma das estratégias usadas para acabar com a produção familiar foi o estímulo à criação de máquinas de grande porte que só cabiam nos galpões das fábricas. A justificativa acerca da eficiência das grandes máquinas do século XVIII já foi devidamente superada pelos estudiosos, que provaram que o aumento de produtividade obtida pelo sistema de fábrica nos seus primeiros tempos se explica melhor pela utilização da mão-de-obra em jornadas muitos extensas de trabalho – poderiam chegar a dezoito horas por dia – do que pela eficácia das máquinas.
A máquina foi o caminho usado pelo capitalismo para reunir os trabalhadores em um mesmo lugar onde ele pudesse controlar todos os movimentos dos operários para que não houvesse desperdícios de tempo ou de mercadoria. Esse processo fatalmente significou o fim das oficinas caseiras. Além disso, a introdução do sistema de fábricas produziu novas relações sociais que passaram pela expropriação dos saberes que o trabalhador controlava no contexto da produção artesanal. O introdução da divisão do trabalho com parcelamento de tarefas limitou o saber do operário a sua tarefa desvalorizando ainda mais o seu trabalho. Por outro lado, ”(...) foi no sistema de fábrica que uma dada tecnologia pôde se impor não apenas como instrumento para incrementar a produtividade do trabalho, mas, muito principalmente, como instrumento para controlar, disciplinar e hierarquizar esse processo de trabalho.”. (Edgar Salvatore De Decca, O nascimento das fábricas).
O processo de disciplinarização do trabalho impôs aos primeiros operários fabris a noção de tempo útil e é nela que encontramos a imposição não somente de uma nova forma de organizar o trabalho como também de discipliná-lo: “Aqueles primeiros homens, que se viram constrangidos pela pregação moral do tempo útil e do trabalho edificante, sentiram em todos os momentos de sua vida cotidiana o poder destrutivo desse novo princípio normativo da sociedade. Sentiram na própria pele a transformação radical do conceito de trabalho, uma vez que essa nova positividade exigiu do homem pobre a sua submissão completa ao mando do patrão. Introjetar um relógio moral no coração de cada trabalhador foi a primeira vitória da sociedade burguesa, e a fábrica apareceu desde logo como uma realidade estarrecedora onde esse tempo útil encontrou o seu ambiente natural, sem que qualquer modificação tecnológica tivesse sido necessária. Foi através da porta da fábrica que o homem pobre, a partir do século XVIII, foi introduzido ao mundo burguês.”. (Edgar Salvatore De Decca, O nascimento das fábricas).
A idéia de tempo útil, por sua vez, levanta a questão de que além da imposição de uma nova tecnologia, a revolução industrial se fez acompanhar de todo um conjunto de idéias destinadas a inserir o trabalhador nos marcos de uma produção que interessava aos capitalistas. Essa nova forma produzir se fez acompanhar das noções de disciplina e hierarquia e, ao mesmo tempo, retirou dos operários a capacidade de avaliar o valor do seu próprio trabalho já que, na fábrica, ele foi destituído dos saberes técnicos a respeito da própria produção que estava realizando. Segundo De Decca, “Desde as origens do sistema de fábrica, estiveram em jogo, portanto, relações de poder que, passo a passo, determinaram o próprio limite da produção de saberes técnicos. Em outras palavras, a luta transcorrida desde a instalação do “putting-out system”[1] até a consolidação do sistema de fábrica não foi outra coisa a não ser a instituição do próprio social e do domínio desse social como apropriação de saberes. Se, do lado do “putting-out system”, o dispositivo do mercado fazia com que o saber técnico, detido pelos trabalhadores domésticos, representasse um momento de sua autonomia quanto ao domínio do processo de trabalho, na fábrica, a divisão social, impondo uma disciplina férrea aos trabalhadores, retirava-lhes saberes – dentre eles o técnico – e transferia-os para o mando do capitalista. A partir desse momento, o empresário pode desenvolver toda uma estratégia para que o processo tecnológico não fugisse mais de seu controle. Por isso mesmo, na ordem social, um conjunto de instituições iria aparecer para que, principalmente, pudesse ser garantida a permanência e o controle do capitalista no âmbito do domínio da técnica produtiva e, logo em seguida, transformasse todo o registro dos saberes técnicos. Isto significou, por fim, a criação de um imaginário social voltado para o reconhecimento de uma esfera determinada de produção de saberes técnicos totalmente subtraída e alheia ao controle dos trabalhadores fabris.”. (Edgar Salvatore De Decca, O nascimento das fábricas).

Uma nova sociedade
A separação do trabalhador direto da propriedade dos meios de produção fez com que duas novas classes sociais se configurassem plenamente:
I - A Burguesia Capitalista, que é a classe dos proprietários dos meios de produção.
II - O Proletariado, que é a classe que reúne os trabalhadores diretos, cuja única propriedade é a sua força de trabalho, vendida à Burguesia Capitalista em troca de um salário.
Em uma situação intermediária e transitória entre essas duas classes sociais, encontramos um grupo altamente heterogêneo, denominado Pequena Burguesia, o qual pode ser caracterizado por sua grande diversidade no que diz respeito ao nível de renda, status, condição cultural e profissional, posição ideológica dos seus membros. A grande característica da Pequena Burguesia é a heterogeneidade que a define.
O caráter dessa nova estratificação social que se configura plenamente a partir da Revolução Industrial provocará uma grande irregularidade na distribuição das rendas: o proletariado será espoliado no seu trabalho de forma crescente e intensiva, enquanto a burguesia capitalista acumulará quantidades crescentes de capital em suas mãos. Essa nova realidade social, por sua vez, propiciará o advento de novas determinações de ordem ideológica e de ordem jurídico-política.

A primeira reação contra o sistema de fábrica: os Ludditas
A entrada dos capitalistas naquele sistema em que funcionava o trabalho familiar quebrou todas as regras longamente cultivadas pelos artífices. A ampliação do mercado de consumo criou demandas inéditas para as quais a maior parte dos artesãos não estava preparada. As oficinas começavam a fechar por falta de compradores para suas mercadorias, já que o produtor individual não conseguia competir com o capitalista que contratava o serviço de dezenas de trabalhadores para fabricar os produtos que ele podia vender mais barato.
As oficinas fechavam, os artesãos ficavam sem trabalho. A opção era trabalhar como jornaleiro para o dono da fábrica. Um grupo de artesãos denominados ludditas – ou quebradores de máquinas – não aceitou essa nova condição. Como percebiam o uso que os capitalistas faziam das grandes máquinas, os ludditas invadiam as fábricas e quebravam as máquinas de grande porte, considerando-as responsáveis pelo seu desemprego e miséria.
As invasões eram decididas pelos inimigos das máquinas minutos antes de acontecer. Os participantes se encontravam nas ruas em horários avançados, quando não havia mais circulação de pessoas. Invadiam as fábricas munidos de pedras, pedaços de madeira e metal com os quais atacavam e destruíam as máquinas. Muitas vezes colocavam fogo no galpão que abrigava as máquinas.
Esse comportamento era resultado da situação de desespero que tomou conta da outrora próspera classe dos artesãos. Quando esses trabalhadores pensavam em suas vidas antes do surgimento da máquina e comparavam com o desemprego, privações e desprestígio que estavam vivendo, explodiam em violência contra o “culpado” pela situação, ou seja, contra a máquina. Pelo menos era como os ludditas viam essa questão. A máquina tirou seus empregos e diminuiu o preço das mercadorias, era, portanto, a responsável por sua desgraça.
Houve por parte do governo uma severa repressão aos quebradores de máquinas: aqueles que eram pegos atacando máquinas eram punidos com a morte. Mas, a verdadeira derrota sofrida pelos antigos artesãos foi a vitória do sistema de fábrica.

Revolução, demografia e agricultura
É preciso notar que, se a existência de mão-de-obra urbana abundante e disponível é uma pré-condição da Revolução Industrial, o próprio processo de industrialização catalisará o processo de urbanização dos Estados onde ela se verifica.
Nessa medida, um crescente índice de urbanização é um primeiro aspecto do que estamos denominando de Revolução Demográfica.
Um segundo aspecto é a verificação de uma alteração no ritmo do crescimento populacional, sendo que essa alteração é devida a uma alta nas taxas de natalidade e uma baixa nas taxas de mortalidade.
Tanto a alta da natalidade quanto a baixa da mortalidade são justificáveis a partir da ocorrência de progressos técnicos (por exemplo, na área da medicina, farmacopéias e higiene), que possibilitaram a baixa nos índices de mortalidade infantil ao mesmo tempo que se alongava o período médio da vida humana.
O crescimento populacional, especialmente o crescimento da população urbana que, apesar de consumir alimentos, não os produz, provocou um substancial aumento na demanda de produtos agrícolas. Esse aumento na demanda tornou a agricultura e a pecuária atividades econômicas mais lucrativas e, nesta medida, passou a existir um maior estímulo para a realização de investimentos no setor agrário.
É nesse contexto que as relações de produção capitalistas foram progressivamente penetrando na zona rural. Além disso, novas técnicas foram aumentando a eficiência do trabalho agrícola. Novos sistemas de drenagem e irrigação fizeram crescer as áreas de cultivo. A descoberta dos adubos químicos aumentou a produtividade do solo (até essa descoberta, a Inglaterra realizava apenas uma colheita anual de trigo; a partir dela, passou a realizar duas). Nesse primeiro momento da Revolução Industrial, não é possível falar em mecanização da agricultura, mas sim em uma progressiva penetração do capitalismo nos campos, do aumento da área de cultivo e na utilização de melhores e mais eficientes técnicas agrícolas.

A era do capitalismo liberal
Com a Revolução Industrial nasce o Capitalismo Liberal ou Capitalismo Industrial. No contexto do Capitalismo Liberal, o Estado deve desempenhar a função de instituição responsável pela preservação da paz, da ordem e da segurança. O Estado não deve ter participação ativa no processo econômico, que deve ser inteiramente deixado a cargo da iniciativa privada.
O regime de comercialização dos produtos no Capitalismo Liberal é o da livre concorrência que, segundo os ideólogos do Capitalismo Liberal, leva a uma baixa nos preços e/ou a uma melhoria nos padrões de qualidade (futuramente, teremos oportunidade de demonstrar que tal fato nem sempre é verdadeiro).
A livre concorrência deve se manifestar tanto no plano interno quanto no internacional, daí o Capitalismo Liberal ser livre- cambista, ou seja, todo e qualquer entrave ao comércio mundial de exportação e importação era criticado. Não há lugar para o protecionismo alfandegário no mundo do Capitalismo Liberal.
A posição livre-cambista é plenamente coerente com a realidade histórica do final do século XVIII e primeira metade do século XIX. Por essa época, a Inglaterra era, sozinha, a grande potência industrial do mundo. Logo, para ela, quanto maiores fossem as facilidades de comercialização internacional, melhor seria. Por outro lado, para os países não-industrializados, não havia sentido em dificultar as importações através de um protecionismo alfandegário, já que suas próprias condições estruturais os obrigavam a importar os produtos ingleses. Por sua vez, a adoção do livre-cambismo funcionava como um fator castrativo de qualquer pretensão industrialista, pois uma eventual produção nacional já nasceria tendo de concorrer com a produção inglesa, que invariavelmente possuiria melhores condições tecnológicas e, portanto, mais elasticidade de preços.
[1] Sistema de manufaturas.